16.5.06

Uma imagem mil vezes repetida e o mau-perder dos fumadores

1.Existem diversas formas de intoxicação. Se preferir ler algumas linhas sobre o tabaco, fumadores activos e passivos deve o leitor dirigir o seu olhar e a sua atenção directamente para o ponto 2) deste texto. Todavia, se quiser sorrir por uns momentos e conhecer outra forma de intoxicação, continue a ler.
De vez em quando surgem erros informáticos que abalam temporariamente alguns sites da Internet. Confesso que a princípio julguei estar na presença de um caso desses mas rapidamente dei conta que não havia engano nenhum. Quem se deslocar a www.sejd.gov.pt – Portal da Secretaria de Estado da Juventude – e aceder a uma área chamada “Em Foco”, encontrará mais de cinquenta fotografias ( não são cinco, são cinquenta ) fotografias de Laurentino Dias, o próprio Secretário de Estado. Nessas admiráveis fotos encontramo-lo a discursar, a descerrar, a conviver, a ouvir, a premiar, a apreciar, a exclamar, a reclamar, a inaugurar, a responder, a criticar, a lamentar, a festejar. Títulos como “Laurentino e a lei de bases” ou “Laurentino Dias na Argélia para aprofundar a cooperação são bem exemplo do ridículo a que se chega.
Parece que o referido portal foi feito para um desfile de poses propositadamente para confirmar a tendência propagandística. O facto de não existirem duas fotografias iguais pressupõe já alguma atenção na escolha e um bom domínio do programa informático. Por outro lado, este episódio mostra que o projecto “Simplex” está realmente a funcionar: é verdade ou não que não existe nada mais simples do que encher um site sempre com o mesmo protagonista?
Se repetir mil vezes a mesma mentira faz dela uma verdade, neste caso repetir cinquenta vezes o mesmo rosto não faz dele um bom governante.

2.Se o leitor veio directamente para este ponto não sabe o que perdeu em cima mas, tudo bem, a escolha foi sua… Estávamos então a falar de intoxicações. Ora andam aí uns fumadores militantes a protestarem desesperadamente contra as medidas de protecção dos não-fumadores. Eles confundem propositadamente o inquestionável direito que tem o cidadão a não inalar involuntariamenteo fumo dos outros com uma pretensa guerra do “politicamente correcto” contra o coitado do fumador.
Se se seguisse o ridículo argumento de que o não-fumador poderia evitar os sítios com fumo, então bastar-lhe-ia evitar as entradas dos cinemas, dos teatros e dos hotéis, os restaurantes, as discotecas, os bares, os centros comerciais, as salas dos professores e grande parte dos locais de trabalho.
Por ser verdade, é preciso dizer que o “fumo público” é cancerígeno e indutor de crises respiratórias. Ele é constituído pelo fumo que sai directamente do cigarro em combustão e pelo fumo exalado pelo fumador activo. Actualmente, a evidência científica diz-nos que é possível medir o fumo ambiente e as suas consequências na saúde de duas maneiras: a primeira é através da detecção dos componentes do fumo do tabaco na atmosfera ( estudos realizados em bares com espaços dedicados a fumadores e não-fumadores detectavam as pequenas partículas de fumo do tabaco em todo o recinto por igual, provando assim a inutilidade prática da divisão dos espaços ); a segunda é através da detecção de biomarcadores no sangue, na urina e na saliva dos não-fumadores ( está provado que um bebé de colo exposto a mãe fumadora de um maço de cigarros por dia inala fumo equivalente a 3-4 cigarros inteiros ).
Não faltam estudos desde 1981 sobre a história dos fumadores passivos. Todos eles mostram à evidência uma associação entre o fumo passivo e o cancro do pulmão em dezenas de milhares de sujeitos. Para além disso, investigação clínica veio a determinar que o fumo passivo causava outras doenças em adultos. Os estudos relacionando a doença coronária com o fumo do tabaco são muito claros nas suas conclusões do efeito prejudicial do tabagismo.
O que aqui se defende não é proibir o uso do tabaco mas proteger apenas quem não fuma. Se é difícil para um fumador não fumar num restaurante, também é difícil pagar os impostos cada vez mais altos ou respeitar os 120 km/h na auto-estrada. A verdade é que vivemos em sociedade e nela existem as restrições da liberdade. Chamamos-lhe civilização!

Alfornelos, Centro Comercial de Belém e o falecido notificado

1.Em Alfornelos os moradores constituíram uma associação cívica. O problema é que com a articulação de três vias de tráfego muito intenso ( IC17-CRIL, IC16-Radial da Pontinha e Radial de Lisboa ) e a conclusão da CRIL, entre a Buraca e a Pontinha. Aquela localidade, onde vivem umas quinze mil pessoas, transformar-se-á numa autêntica ilha cercada por auto-estradas por todos os lados. Está prevista a passagem diária de duzentos mil automóveis e a referida associação cívica tem feito tudo o que está ao seu alcance para evitar este autêntico “encurralamento”, um claro gueto de poluição ambiental, sonora e visual, de graves riscos permanentes de vida e de deterioração total da dessa qualidade num local onde vivem também jovens e idosos.
Defende esta associação uma solução que, para além de ser a de menor custo, a melhor e a mais segura, é “a única que respeita as regras mínimas de segurança rodoviária e possui um traçado de fácil execução técnica”. Repare-se que na procura de uma solução, esta associação não corta estradas, não chama as televisões, não provoca desacatos, não oferece espectáculos em frente da Assembleia da República. Pelo contrário, os habitantes criaram uma associação cívica, encomendaram um projecto alternativo, fizeram exposições, contactaram as entidades responsáveis, invocaram o direito aplicável nestes casos. O que ganharam com isso?
Depois de vermos o dinheiro gasto com uma passagem de sapos por debaixo da CRE; as “pegadas dos dinossauros” em Carenque, também na CREL; a interrupção na construção da estrada em Bragança devido ao aparecimento de uma colónia de ratos e outra de morcegos, concluímos que o problema de Alfornelos é precisamente a ausência de uma colónia de formigas raras. Existisse ela e tudo seria feito para se agir de outra maneira.
Assim, fácil se torna verificar que os habitantes de Alfornelos não contam para nada nem para ninguém. Ao contrário das formigas…

2.O Centro Cultural de Belém acabou de ser oferecido ao comendador Berardo. Não, a frase está correcta e não está invertida. Das quatro mil obras de arte da colecção do empresário, apenas 862 fazem parte do protocolo e passarão a ocupar o centro de exposições do Centro Cultural de Belém ( CCB ), totalmente cedido a uma nova fundação privada.
Tal fundação terá como presidente honorário e vitalício o comendador Berardo, que fica com o poder exclusivo de nomear ou destituir o director do futuro museu, que terá o seu nome. Os dois membros do Conselho de Administração, designados por Berardo, serão os únicos que podem deliberar a fusão, cisão, dissolução ou transformação da fundação. Esta mesma fundação será subsidiada pelo Estado, bem como os custos logísticos, manutenção e recuperação assim como os custos inerentes ao funcionamento do museu que serão suportados pelo CCB. Este vende os bilhetes, mas o dinheiro é para a fundação.
O protocolo prevê o investimento anual de 500mil euros para aquisição de novas obras mas, embora assinado, não se sabe como será o museu, quem o vai dirigir e qual o valor do reportório artístico. Ao fim de dez anos, a colecção pode ou não ficar em Portugal. Se o Estado a quiser comprar, terá de ser, pelo menos, pelo valor a ser determinado por uma leiloeira. Mas o comendador não fica obrigado a vender.
Desta forma, Lisboa fica sem um local capaz de acolher certames internacionais e sem acesso ao circuito internacional de exposições. Berardo teve tudo o que queria e pode continuar a expor pelo mundo fora.
Nós pagamos para ver o CCB transformar-se em Centro Comercial Berardo. Quem parte e reparte e não fica com a melhor parte ou é tolo ou não tem arte. O comendador é um espertalhão. Vocês sabem do que eu estou a falar…

3. Num acto verdadeiramente inqualificável dos Serviços do Ministério Público de Lagos, foi enviada uma notificação que chegou, via postal, no dia 29 de Março deste ano. O destinatário já tinha morrido mas este é um “simples” detalhe. A carta é bem explícita: “Notifica-se V. Exª, na qualidade de Falecido, nos termos e para os efeitos a seguir mencionados: Para no prazo de 10 dias, vir aos presentes autos, levantar a certidão requerida.” O que irá acontecer aos autores? Evidentemente, nada…