10.12.07

A ASAE e a Ginjinha do Rosssio

Lembram-se da história do homem que mordeu o cão? Muito pouca gente se lembrará e estará agora a pensar: que diabo!! Não será o contrário? Então não terá sido o cão que mordeu o homem? Talvez tenham razão mas às vezes fazemos confusão…

O leitor ou conhece ou ouviu falar da “Ginjinha do Rossio”, em Lisboa. Sim, é essa mesmo. Esse estabelecimento de bebidas especializado na venda de uma das mais populares bebidas portuguesas, a ginjinha. Com o tempo, a “Ginjinha do Rossio” tornou-se uma referência para turistas que passam pela zona e para várias gerações de frequentadores despretensiosos que, por razões certamente inexplicáveis, continuam a passar pelo seu balcão e a pedir "uma com elas" ou "sem elas". Uma ginjinha, no fundo. O estabelecimento nunca envenenou ninguém, sendo certo que também não é um modelo de limpeza. Mas todos a conhecem. É a “Ginjinha do Rossio”.

De acordo com investigações recentes, a melhor ginja é a da zona de Óbidos e a “Ginjinha do Rossio” servia-a, claro. Seja como for, Óbidos por um lado, e a “Ginjinha do Rossio” por outro, enchem-se de turistas e de apreciadores que vão em busca dessa bebida simpática, comovente e em risco de vida.

Ora bem, a ASAE, Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, decidiu partir agora em busca da “Ginjinha do Rossio”, encerrando-lhe as portas. O argumento é a falta de higiene, tendo sido capturadas algumas garrafas da bebida. Não, não se pense que algum turista se queixou de ter sido atingido por uma ginja. A questão é outra e nada cómica.

Ao capturar as garrafas e ao encerrar o estabelecimento, a ASAE estava apenas a cumprir a sua função, que está distribuída pela segurança alimentar, pela segurança de produtos e instalações, pelas questões de propriedade intelectual e industrial e também - naturalmente - pelo turismo. Ou seja, a ASAE zela pelo cumprimento da lei. E zela de forma muito eficiente, apresentando-se ao serviço público de colete à prova de bala e de gorro de lã. Por aí já o leitor vê como é arriscado o seu trabalho e como é perigoso o mister de fiscal das actividades relacionadas com a segurança alimentar. Os seus agentes preparam-se para aquilo que não aconteceu ao inglês. O lema é: se não aconteceu podia muito bem ter acontecido.

Acontece que Portugal é, segundo a ASAE (e depois das suas investidas) "um dos países mais seguros no que diz respeito à higiene e qualidade dos alimentos". Isso é uma vantagem enorme. Pensem bem no que aconteceria caso não o fôssemos. Hoje já não há castanhas assadas embrulhadas nas Páginas Amarelas nem bolas-de-berlim nas praias. Os tremoços manuseados com aquelas medidas de madeira estão sob suspeita.

A “Ginjinha do Rossio” era um monumento nacional. Uma referência que todos procuravam para provar uma das melhores ginjinhas portuguesas. Aquele espaço “tresandava” a história e a convivialidade, a sorrisos largos e a um leve ondular de fígados conservados em ginja. Pois que se varresse o seu chão com mais frequência. Que se pusesse um médico à porta. Que se emprestasse um capacete a cada cliente.
O mal, porém, não é apenas o encerramento da “Ginjinha do Rossio”, esse parapeito da história da cidade e do país. O mal é a onda de lixívia sintética que vai passando por tudo quanto é "segurança alimentar" nas vetustas tascas onde vinhos fatais fizeram literatura e, certamente, doenças hepáticas. Essa onda que prega a normalização dos costumes alimentares acabará com a pequena alma dessas nobres instituições de pecado, como a “Ginjinha do Rossio”.

Portugal aplica estas leis melhor do que ninguém. A breve prazo, agentes policiais entrarão nas nossas casas apreendendo bacalhau com excesso de sal, os enchidos de Alpalhão, o medronho do Algarve e os bolos com excesso de açúcar. Seremos saudáveis, faremos jogging e usaremos Armani. Tudo o resto será encerrado. Um último conselho, não se esqueçam de apagar a luz à saída…

Nova Aliança, 29 / Novembro / 2007

19.11.07

A Ota, o Estatuto dos alunos e as 'vistas de olhos' nos relatórios

31 de Outubro - Segundo o estudo da CIP, Alcochete é uma localização mais competitiva do que a Ota, para o novo aeroporto de Lisboa.

Entre outras coisas e de acordo com aquilo que foi noticiado, o estudo conclui que "os custos mais baixos de Alcochete têm uma enorme vantagem competitiva que os decisores políticos não podem ignorar: por serem mais baixos, esses custos de construção e instalação do novo aeroporto de Lisboa permitirão taxas muito mais baratas e uma competitividade internacional de tal modo superior à da Ota que não poderá ser desaproveitada".

Os desertos também podem ser competitivos.....
2 de Novembro - Gosto da solução encontrada pela Ministra da Educação para o absentismo. Aluno que falta tem que fazer uma prova de recuperação e poderá ser obrigado a ficar mais tempo de castigo na escola. Isto se não faltar à prova de recuperação e ao castigo, claro. Parece que a pena para faltar à prova de recuperação e ao castigo é uma prova de recuperação e tempo de castigo na escola. Isto se não faltar à prova de recuperação e ao castigo, claro. Se faltar tem que fazer uma prova de recuperação e poderá ser obrigado a ficar mais tempo de castigo na escola. Se não faltar. Mas se faltar, castigo e prova de recuperação ...

3 de Novembro - Do Diário Digital: «Programa Risco Zero
MAI estuda sistema diferenciação entre bons e maus condutores
Risco Zero é o nome do programa, já entregue e a ser alvo de análise do Ministério da Administração Interna (MAI), que visa reduzir a sinistralidade rodoviária, através da atribuição aos condutores de um de três dísticos (verde, amarelo e vermelho), segundo o número de acidentes que já tenham provocado.»

Por exemplo escolas, hospitais, segurança social... passariam a ostentar «um de três dísticos (verde, amarelo e vermelho)» consoante cumprissem os seus objectivos. Podia assim aplicar-se esta sinalética na qualidade dos serviços…

5 de Novembro - Futuro anúncio do Ministério da Educação:
" És jovem? Queres farra? Não queres responsabilidades? Queres uma vida boa sem obrigação de cumprir horários?
Então este anúncio é para ti:
inscreve-te na escola mais próxima e junta-te à malta, vem fazer parte deste enorme grupo de borga que são as escolas e os alunos!!
Não hesites, tens um ESTATUTO."

Adendas ao Estatuto:
1. Os alunos deverão estar na aula de bonés, barretes ou gorros enfiados nas respectivas cabeças, se não, as ideias fogem-lhes e lá temos mais insucesso.

2. Os alunos poderão - melhor, deverão - durante as aulas, ouvir música nos respectivos mp-3, bem como escrever mensagens ou atender os seus telemóveis sempre que queiram. O contrário seria não entender a importância do «choque tecnológico».

3. Sempre que um aluno estiver a perturbar a aula, o professor terá de tomar uma atitude drástica, em vez de ignorar a situação, como tantos fazem: o professor deverá, pois, repreender-se a si mesmo, marcar-se falta de castigo e abandonar de imediato a sala.

4. De agora em diante, o castigo a ser aplicado aos alunos é, nos casos mais graves, três semanas de suspensão: porque quem se porta mal precisa de um tempo para descansar; quanto às faltas, como se sabe, justificadas ou não, deixarão de contar para a reprovação.

6 de Novembro - O Sr. Ministro Mário Lino "ainda não teve tempo de ler o estudo" da CIP sobre o novo aeroporto de Lisboa.
Mas já assegurou que lhe dará "uma vista de olhos".
Aliás, o Sr. Ministro recebe todos os dias muitos estudos.
Obviamente, não tem tempo para os ler.
Será que o Sr. Ministro também terá dado "uma vista de olhos" naqueles estudos irrefutáveis sobre a OTA?

7 de Novembro - O Ministro Mário Lino disse que iria dar uma vista de olhos no estudo da CIP sobre o aeroporto de Alcochete. Uma vista olhos deve ser uma boa meia hora a ler na diagonal. Como a CIP alega saber como se podem poupar 3 mil milhões de euros ao Estado, este dado permite-nos calcular qual deveria ser o salário justo de Mário Lino. Vamos partir do princípio de que o estudo da CIP tem 10% de probabilidades de estar correcto*. Trata-se de uma estimativa conservadora. Isto significa que podemos estimar que a leitura do relatório da CIP poderá representar uma poupança provável de 3 000 000 000 * 0.1 = 300 000 000. Como meia hora é tudo quanto Mário Lino consegue dispensar a este assunto, devemos concluir que ele tem coisas mais importantes para fazer. Coisas que poupariam ao Estado pelo menos cerca de 300 milhões de euros por cada meia hora de trabalho. O salário justo do ministro é portanto pelo menos 300 milhões de euros por cada meia hora de trabalho. O que dá 4 800 milhões de euros por dia e cerca de 96 mil milhões de euros por mês.

* isto é, Mário Lino tem boas razões para considerar que deve atribuir uma probabilidade de 10% à possibilidade de o estudo da CIP estar certo.

Nova Aliança, 15 / 11 / 2007

4.11.07

O filho pródigo, o "rigor" de Constâncio e o legado de Amália

17 de Outubro - Aparentemente sem surpresa, o país descobriu que o BCP violou regras bancárias e favoreceu accionistas, entre eles um filho de Jardim Gonçalves. Os casos conhecidos reportam a 2004. Como o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras está em vigor desde 1993, os eventuais ilícitos caem sob a sua alçada. O que é que aconteceu? Quanto se sabe, o BCP perdoou uma dívida de doze milhões de euros a uma empresa de Filipe Vasconcelos Jardim Gonçalves, e outra dívida de quinze milhões de euros ao accionista Goes Ferreira, que se viu dispensado de pagar os juros do empréstimo contraído para comprar acções nos aumentos de capital de 2000 e 2001. Nos dois casos, o perdão da dívida foi avalizado por Filipe Pinhal, actual CEO, bem como por Alípio Dias, administrador apontado como hipotético sucessor de Jardim Gonçalves. Em todo o caso, o banco não teve a mesma benevolência com accionistas que empataram economias modestas ou contraíram pequenos empréstimos para (induzidos pelo banco) comprarem acções nos referidos aumentos de capital. É bem verdade que o respeito se mede em milhões. A ver vamos o que a CMVM e o Banco de Portugal dizem do tratamento desigual entre accionistas. Joe Berardo e Pedro Teixeira Duarte são dois dos que estão à espera para decidir se avançam com uma queixa. E o imbróglio não fica por aqui. Sabe-se que o BCP também perdoou quase por inteiro uma dívida de 40 milhões de euros de José Jorge Valério, um dos fundadores do banco. Pode ser que tudo isto tenha vindo à tona em consequência da guerra pelo controlo do BCP. Pode ser que seja só isso. E pode ser ainda que a procissão ainda vá no adro. Uma zanga entre banqueiros de Deus tem sempre este efeito letal.

18 de Outubro - Para além da habilidade administrativa, graças ao PS, cada assessor passará a receber, sensivelmente, mais 1400 Euros/mês do que no tempo de Carmona Rodrigues. Na prática, na actual gestão do PS na CML, cada assessor tem um valor mensal (mínimo) próximo dos 4 000 Euros.
Temos, de novo, o PS no seu melhor. Nas despesas não se toca. Só se aumenta. A proposta do PS teve a santa anuência do PCP, PSD e da Helena Roseta. O Zé votou contra.
Outro aspecto curioso é o número de assessores nos Gabinetes dos Vereadores do PS. Mantêm o número de assessores aprovado na Proposta mas estão a requisitar técnicos aos Serviços autárquicos, esvaziando os respectivos Serviços de pessoal qualificado. Oficialmente os técnicos continuam afectos aos Serviços mas, no dia a dia, estão nos Gabinetes dos senhores Vereadores.

19 de Outubro – Infelizmente o senhor Constâncio do Banco de Portugal não muda. Ontem declarou que não o preocupa a subida da despesa pública, apenas está preocupado com o défice. Outros tempos, outro governo, outras exigências, não é senhor governador? A subida sustentada da carga fiscal é um peso para as famílias e uma das razões que atrasará a retoma da economia. Longe vão os tempos em que o senhor Constâncio, cheio de rigor, ”anunciava” o défice que este governo herdaria. Hoje em dia já não “convém” voltar a medir com os mesmos critérios o défice real, sem estradas e hospitais de fora e, já agora, os salários dos funcionários, públicos e não só, sem as receitas extraordinárias como as que provém da concessão das barragens à EDP por mais vinte anos e por aí adiante.

22 de Outubro - O despacho do Primeiro-Ministro que considera a Fundação Amália Rodrigues "pessoa colectiva de utilidade pública" na condição de "comprovar a regular constituição dos orgãos sociais e a inexistência de dívidas fiscais à Segurança Social e de entregar a documentação legalmente exigível" revela uma filosofia aterradora na gestão dos prémios da coisa pública.
A partir de agora, o acesso às isenções fiscais que a utilidade pública confere não obriga a nada. Basta não cometer ilegalidades; pior, podem-se cometer ilegalidades, desde que estas sejam sanadas num prazo razoável.
Dificilmente poderia conceber uma instituição que merecesse menos este reconhecimento. Conhece-se a história da Fundação Amália Rodrigues. O advogado, nomeado por Amália executor testamentário, auto-proclama-se presidente vitalício da fundação logo após a morte da fadista e estabelece estatutariamente que lhe sucede o filho, à época estudante, também vitaliciamente.
A verdade é que a Casa do Artista nunca recebeu um cêntimo, não há obras de caridade apoiadas e o espólio de Amália Rodrigues está por clarificar. A única obra visível desta fundação é a abertura da Casa-Museu e, segundo notícia do Correio da Manhã, uma dívida de 2,3 milhões de euros ao fisco.
Se exceptuarmos o advogado e o seu filho, que podem ser considerados como público, dificilmente se poderão encontrar características de "utilidade pública" nesta trapalhada.
Não parece ser este o entendimento do primeiro-ministro, que premeia a coisa com honrarias e isenções fiscais. E a pressa é tão grande que nem pede à fundação que formalize a candidatura entregando a documentação e fazendo prova de não ter dívidas. Pelo contrário, concede-lhe os privilégios a crédito, tipo "isente-se agora e mostre depois que é merecedor". Aguardo o próximo episódio.

Nova Aliança, 2 / 11 / 2007

31.10.07

O rugby, correr com o Sócrates, os portáteis e a legislação

30 de Setembro - O rugby é dos poucos desportos colectivos com bola – senão o único – em que é praticamente impossível fazer ronha e “anti-jogo”, passar tempo, jogar à defesa: a única defesa possível é conquistar a bola e atacar, atacar sempre. Não há atrasos, floreados do tipo venham cá ver se me tiram a bolinha, olhem que bem que eu jogo: quem a tem, ou corre para a frente ou a passa, porque no próprio segundo em que a agarra tem sempre uma matilha de adversários em cima dele, danadinhos para o mandar ao chão.
É um jogo de força física, e sobretudo de persistência, sacrifício, disciplina colectiva e entreajuda. Admitindo que haja uma coisa chamada carácter português, seria difícil encontrar um jogo com exigências a que ele fosse tão avesso. É talvez por isso que tem tão pouca expressão entre nós.
2 de Outubro - Sócrates voltou a dar uma corridinha antes de se encontrar com um dirigente mundial. O facto de o PM português correr não é nem louvável nem reprovável, o facto de só o fazer em público quando vai ao estrangeiro ( por cá nunca o vimos correr quando sai de casa para São Bento nem quando visita Cinfães do Douro ), faz-nos suspeitar que a corrida é uma espécie de seguro de interesse jornalístico. Se mais nada houver, há sempre a história da corrida.

Ou é isso ou é apenas uma obsessão provinciana. Assim como havia um doido que gostava de beijar figuras públicas, o Primeiro-Ministro português é capaz de gostar de poder contar que correu ao pé delas.
Fazíamos uma vaquinha e comprávamos uma passadeira para o PM por no gabinete. Sempre saia mais barato que lhe andar a pagar as viagens.


3 de Outubro - “Sete ministros e 13 secretários de Estado distribuíram cerca de dois mil computadores portáteis a professores e alunos em estabelecimentos de ensino de todo o país”

O governo deu os números oficiais da mais "emblemática medida do choque tecnológico". Vinte ministros e secretários de estado distribuíram dois mil computadores. Dá 200 computadores na mala de cada carro do estado. As mesmas fontes ainda gabam as 70 mil inscrições para o projecto. É fazer as contas: se distribuíram dois mil, quer dizer que há 68 mil portugueses que foram enganados.

4 de Outubro - A ideia de não permitir mais lojas chinesas na Baixa é bastante infeliz por dois motivos: primeiro: porque, salvo em casos excepcionais e transitórios, em que esteja em causa o interesse da comunidade como um todo, o Estado (central e local) não deve intervir no comércio, senão na estrita medida necessária para garantir o cumprimento de normas gerais e abstractas - isto é, aplicáveis a todos, sejam chineses, portugueses, neozelandeses ou outros que tal; segundo: porque, ainda que uma medida deste tipo fosse objectivamente legítima (o que não parece ser o caso), ela sempre seria errada do ponto de vista político, pois estaria a proteger não o bem comum (a população), mas quem não justifica qualquer tipo de protecção. O dito “comércio tradicional” da Baixa é vergonhoso. Livremente vergonhoso. Abre quando quer e lhe apetece; não oferece um mínimo de qualidade; e só sobrevive à custa de um mercado muito pouco existente e pobre (como é o nosso) e de uma lei de rendas que tem sido ruinosa para a cidade.

Questão diferente é a possibilidade de, por acordo, se criar uma zona onde possa concentrar-se um número significativo de lojas e restaurantes chineses. Em várias cidades civilizadas do mundo ocidental há anos que isso acontece, e ninguém parece queixar-se do facto. Mas esta é uma questão que já não tem nada a ver com a Baixa. O “comércio tradicional” da Baixa, com mais, menos ou nenhumas lojas chinesas, enquanto não for alterada a situação das rendas e renovada a população residente e transeunte, continuará a ser miserável.

7 de Outubro - António Barreto revela-nos hoje uma preciosidade de um Ministério que alega ser da educação, assinada por um secretário de estado, que no entender de Maria Filomena Mónica alega ser "Dótor".

"[...]A existência de constrangimentos na operacionalização do regime de permeabilidade estabelecido pelo Despacho n.º 14387/2004 (2.ª Série), de 20 de Julho, bem como os ajustamentos de natureza curricular efectuados nos cursos científico-humanísticos criados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março, implicaram a necessidade de se proceder ao reajuste do processo de reorientação do percurso escolar do aluno no âmbito dos cursos criados ao abrigo do mencionado Decreto-Lei n.° 74/2004, de 26 de Março. Desta forma, o presente diploma regulamenta o processo de reorientação do percurso formativo dos alunos entre os cursos científico-humanísticos, tecnológicos, artísticos especializados no domínio das artes visuais e dos audiovisuais, incluindo os do ensino recorrente, profissionais e ainda os cursos de educação e formação, quer os cursos conferentes de uma certificação de nível secundário de educação, quer os que actualmente constituem uma via de acesso aos primeiros, criados ao abrigo do Decreto-Lei n.° 74/2004, de 26 de Março, rectificado pela Declaração de Rectificação n.° 44/2004, de 25 de Maio, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.°24/2006, de 6 de Fevereiro, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 23/2006, de 7 de Abril, e pelo Decreto-Lei n.° 272/2007, de 26 de Julho, e regulamentados, respectivamente, pelas Portarias n.° 550-D/2004, de 22 de Maio, alterada pela Portaria n.° 259/2006, de 14 de Março, n.° 550-A /2004, de 21 de Maio, com as alterações introduzidas pela Portaria n.° 260/2006, de 14 de Março, n.° 550-B/2004, de 21 de Maio, com as alterações introduzidas pela Portaria n.° 780/2006, de 9 de Agosto, n.° 550-E/2004, de 21 de Maio, com as alterações introduzidas pela Portaria n.° 781/2006, de 9 deAgosto, n.° 550-C/2004, de 21 de Maio, com as alterações introduzidas pela Portaria n.° 797/2006, de 10 deAgosto, e pelo Despacho Conjunto n.° 453/2004, de 27 de Julho, rectificado pela Rectificação n.°1673/2004, de 7 de Setembro. Assim, nos termos da alínea c) do artigo 4.° e do artigo 9º do Decreto-Lei n.° 74/2004, de 26 de Março, rectificado pela Declaração de Rectificação n.°44/2004, de 25 de Maio, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 24/2006, de 6 de Fevereiro, rectificado pela Declaração de Rectificação n.°23/2006, de 7 de Abril, e pelo Decreto-Lei n.° 272/2007, de 26 de Julho, determino:[...]"

Depois de ler em voz alta, como Barreto solicita, verifiquei que o meu grau de iliteracia (na definição da ilustre Benavente) é muito elevado. Por isso chego à conclusão que Maria Filomena Mónica está enganada. Valter Lemos é um verdadeiro "Dótor" pois, para ter elaborado a peça legislativa que parcialmente acima reproduzi, muitos livros de leis deve ele ter carregado.


Nova Aliança, 18 / 10 / 2007

9.10.07

A nova Chinatown, o quadro desaparecido e a ambulância de tipo A-1

18 de Setembro - A acreditar na mitologia de alguns, a América é um vasto campo de sombras, assolado pelo “neoliberalismo”, onde se arrastam, gemebundas e inanes, multidões em sofrimento, esquálidas e cobertas de moscas e crostas. Neste tormentoso mundo de horror e morte, a besta negra maldita é o sistema de saúde americano, dado como o pior do universo, e não faltam especialistas que tal juram pelo seu coiro, começando pelo senhor Michael Moore, e acabando nos alegres “jornalistas” que se citam uns aos outros, em círculo fechado, como fontes credíveis.

19 de Setembro - Quem é que António Costa quer enganar? Vem dizer que «não devemos misturar as ideias pessoais de Maria José Nogueira Pinto sobre essa matéria com um projecto relativamente ao qual ela esteve ligada e que poderá vir a estar ligada no futuro».
Perdão, mas as coisas não se podem separar só porque tal seria o desejo do presidente da câmara. Evidentemente que as ideias pessoais de MJNP são relevantes. Tanto o são que a própria MJNP entende que sejam uma prioridade no seu novo cargo: «Outra prioridade imediata, diz, “é travar o declínio (da Baixa-Chiado)”. A antiga vereadora dá como exemplo “travar a proliferação das lojas chinesas, porque se continuam naquele território, nunca mais vai ser possível deitar mão ao pequeno comércio”. Nogueira Pinto considera que o comércio “é central” para a Baixa, mas sem as lojas chinesas, que “estão a dar cabo do comércio da cidade”.».

Ora, temos então uma de duas situações: ou António Costa desconhecia as ideias de MJNP e então não se entenderá porque a convidou, pois apenas restaria a incompetência política ou favor pessoal. Ou sabendo o que ela pensava e com isso a convidando, apenas agora aparentemente se afastará dessas ideias, pela reacção que as mesmas provocaram. O que será um sério desvio à verticalidade política, com resultado agravado pela manutenção do convite.
20 de Setembro - O Centro Cultural de Belém anunciou hoje ter encontrado no seu acervo um quadro de Júlio Pomar, intitulado “Camões”, dado como desaparecido há quatro anos.

Num comunicado enviado às redacções, o gabinete de imprensa do CCB adianta que a pintura de 1989 foi encontrada durante “a reorganização dos espaços das reservas” do centro, tendo já sido comunicado o facto ao pintor e à Polícia Judiciária, que abrira um inquérito ao desaparecimento. O quadro, um acrílico sobre tela de grandes dimensões (1,95mx1,30m), foi dado como desaparecido em Setembro de 2003, quando a Presidência da República solicitou ao Ministério da Cultura a sua cedência, a fim de ser integrado numa exposição de Arte Portuguesa que iria realizar-se em Istambul, adianta a nota.Um inquérito interno ao caso, ordenado pelo Ministério da Cultura, terminou meses depois sem que a obra tivesse sido localizada, conseguindo-se apenas apurar que fora vista pela última vez em público em Junho de 1994, numa exposição em Paris, tendo sido entregue ao CCB três meses depois.

Nos dois anos seguintes, surge listada em documentos internos, mas após 1996 não há mais informações sobre a sua localização no acervo. Referindo-se às conclusões do inquérito, em Janeiro de 2004, o semanário “Expresso” noticiava que a então directora do centro de exposições, Margarida Veiga, sublinhava “não era possível assegurar a total inviolabilidade das reservas” do CCB. Apesar do desaparecimento, nem o CCB nem o Ministério da Cultura apresentaram queixa às autoridades, mas a Polícia Judiciária acabaria por incluir o quadro na lista de obras de arte furtadas de colecções públicas – uma informação que é ainda visível no seu site. O acrílico foi adquirido a Júlio Pomar, por dez mil contos (50 mil euros), quando Vasco Graça Moura dirigia a Comissão dos Descobrimentos, tendo ficado registado como propriedade do Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), ficando na posse do CCB.

22 de Setembro - O presidente dos Bombeiros Voluntários de Arcos de Valdevez apontou ontem o centro de saúde local e uma empresa privada de ambulâncias como "os maiores responsáveis" no caso que culminou com a morte de um doente.
Para o presidente dos Voluntários de Arcos de Valdevez, Luís Sá, a BT "apenas fez o seu papel", já que "viu uma ambulância do tipo A-1, que não pode fazer urgências, com as luzes de emergência ligadas e alegadamente a cometer algumas infracções ao Código da Estrada e mandou-a parar, para ver o que se estava a passar".
Se este homem não fosse presidente dos bombeiros e se os agentes em causa não fossem da Brigada de Trânsito da GNR, alguém, ao ler esta notícia, poderia ser levado a pensar que um homem morreu porque alguns guardas estavam a fazer um frete para garantir aos Bombeiros o monopólio de transporte de doentes. Mas logo percebemos que não.

O que está em causa é apenas a observância escrupulosa dos preceitos estabelecidos numa sociedade civilizada. Fez a BT muito bem em obrigar o transporte ilegal a uma paragem de meia hora. Se o doente tinha pressa, que esperasse.

E, como cidadão cumpridor, aqui aviso desde já que se um dia alguém tiver que chamar uma ambulância para mim, exijo uma ambulância que não seja do tipo A1. Até posso falecer à espera, mas numa A1 nunca. Se o senhor presidente dos bombeiros de Valdevez diz que não servem, eu acredito.

Nova Aliança, 4 / Outubro / 2007

30.9.07

Dalai Lama, Chinatown e Maddie

9 de Setembro - Leio no "Público" de hoje que o ministro Luís Amado, declarou que "oficialmente, o Dalai Lama não é recebido por responsáveis do Governo português, como é óbvio". E instado a explicar porquê, explicou-se: "pelas razões que são conhecidas".
Antecipava, por certo, o desprazer que um encontro oficial em Portugal e com algum membro do Governo que está na Presidência da UE não deixaria de causar ao regime de Beijing - tremeriam os negócios da China que a diplomacia portuguesa estará diligentemente, pacientemente, a tecer.
O ministro estava a ser consequente com o que tem sido o tipo de diplomacia em que vai especializando Portugal: nada de incomodar mandarins com conversas parvas sobre direitos humanos; importa é adulá-los e acenar-lhes até com o levantamento do embargo de armas decretado pela UE à conta desse episódio "pré-histórico" do massacre de Tianamen.
Mas como Luís Amado deve ter apurado o paradigma de "nunca correr o risco de desagradar a ricos e poderosos" que vem exercitando, seja a propósito do Iraque, de Guantánamo, da Rússia ou de África, e sendo o Dalai Lama figura cada dia mais bem recebida em Washington (onde acaba de receber a Medalha de Ouro do Congresso), é de esperar que o ministro se empenhe numa saída tão equilibrada, como equilibrista: proporcionando encontros "não oficiais” com altos dignatários portugueses com o Dalai Lama - que até oferece essa conveniente cobertura de ser "líder religioso".
E não consta que do PM belga ao austríaco, do norueguês ao australiano, algum tenha sido comido por Pequim ao pequeno-almoço; pelo contrário, qualquer dos seus países tem (porque soube construir) muito mais visíveis e rentáveis relações económicas com a China do que Portugal... e sem a “desculpa” de Macau…
O esforço não exige nada de especial a oministro: basta esgravatar no saco da velha "esperteza saloia".

15 de Setembro - O Expresso noticia que Maria José Nogueira Pinto, de novo à frente do projecto de reabilitação da Baixa-Chiado, agora pela mão do PS, quer acabar com as lojas chinesas na Baixa de Lisboa. Esta «ideia» pouco fica a dever à «ideia» das amêijoas e das corvinas de Sá Fernandes. Para além de poder ser interpretada como xenófoba (os partidários de Sá Fernandes já escreveram: «a Câmara ter uma “comissária” para a Baixa-Chiado, que já pela segunda vez dá provas da mais bafienta xenófobia é, no mínimo, desprestigiante para uma cidade que se quer moderna, cosmopolita e desenvolvida»), a «ideia» só é concretizável, a curto prazo, violando as mais elementares regras de mercado e violando a Constituição. Ou seja, impedindo (ilegalizando) a compra, o arrendamento ou o trespasse na Baixa a um determinado tipo de comerciantes, em função da nacionalidade (chineses) ou do objecto do comércio (produtos chineses). É óbvio que se trata de uma tonteria. A Baixa lisboeta está degradada, a todos os níveis, e é apenas um ponto de passagem. A restauração definha em qualidade e até a Loja das Meias sucumbiu por falta de clientes, por exemplo. As boas marcas e o comércio de qualidade não querem a Baixa e, por isso, a compra, o arrendamento e os trespasses são baixos em relação a outras zonas da cidade. Só a requalificação daquele território, em função dos desejos, dos hábitos e das necessidades das pessoas (e não em função de «projectos» saídos da cabeça de «iluminados»), que dê nova vida à Baixa, irá permitir a valorização dos espaços físicos, da procura e do comércio, e então, haverá uma selecção da oferta e da qualidade. Um dos males do nosso «planeamento» passa, em primeiro lugar, pela noção de que nunca se executará; em segundo lugar, pela (ir)responsabilidade dos «responsáveis» em função dos resultados. Assim, podemos brincar à vontade às cidades, ao planeamento, etc. O último a sair que apague a luz.

16 de Setembro - Quando eu pensava que seria impossível descer mais baixo do que os "debates" da SIC, eis que a RTP nos oferece um Prós e Contras sobre o caso McCann. Um Prós e Contras, como o nome indica, requer alguém que esteja por qualquer coisa e alguém que esteja contra qualquer coisa. Ora, pergunto eu, os "especialistas" na matéria (que hoje são mais ou menos dez milhões de portugueses) vão estar por e contra o quê?
Haverá um representante dos asssassinos e raptores de criancinhas? E outro das próprias criancinhas? E os cães, senhores, os cães? E o turismo do ALLGARVE, please don`t forget. Deve ser a isto que chamam serviço público.
Pensando melhor, a minha pergunta até é um pouco estúpida. Todos sabemos que os especialistas e os dez milhões vão estar por ou contra, não de quê, mas de quem. E todos sabemos por quem é que ninguém vai estar.
Em vez de debate, podiam chamar-lhe abate. Também é serviço público.

Nova Aliança, 20 / Setembro / 2007

25.7.07

A inauguração da barragem

Confesso e penitencio-me: não estive presente na inauguração da barragem. Já tinha o fato pronto e a gravata escolhida porque me disseram que dessa maneira teria hipótese de presenciar de perto o acto do corte da fita ( eu queria mesmo era aparecer na tv ). Bom, mas a verdade é que, para grande pena minha, um imprevisto me levou para fora da cidade, pelo que só através da televisão pude ver o que na realidade aconteceu.

E vi, ou por outra pensei ter visto mas, depois de ler a nota da Direcção, publicada no último número, tenho de confessar outra coisa: será que podem existir opiniões diferentes da minha? Teremos visto a mesma coisa? Claro que não. Dessa forma, não concordo nada com essa nota e julgo mesmo que há no texto vários equívocos. Mesmo sabendo que, ao transmitir uma posição contrária ao da Direcção, poderei ter dissabores, colocando mesmo em risco o meu futuro no jornal, vou em frente e explicá-los-ei.

Primeiro equívoco. É afirmado que “nunca se tinha visto uma inauguração de uma obra pública, após 32 anos de democracia, policiada até aos dentes”. Ora, parece-me que o sentido que se está a dar a este “policiamento” não é o correcto. O que se passou foi que os agentes, na sua grande maioria, quiseram associar-se aos festejos e transmitir uma manifestação de força à cidade e aos visitantes ilustres. Então, compreende-se que se critiquem as “operações stop” junto da Escola Manuel Fernandes quando se sabe que a estrada que conduz à barragem é muito estreita? Tal operação evitou os engarrafamentos, a confusão e o bom desenrolar da festa. Julgo, por isso, que a Direcção não tem razão.

Segundo equívoco. Já a caminho da denominada “Cidade da Água”, estavam mais duas brigadas policiais. E muito bem, na minha opinião. Não se esqueçam que há estômagos mais sensíveis que têm horas certas para as refeições e um atraso desnecessário no desenrolar do programa poderia levar a complicações gástricas, sempre de evitar. Penso que a associação que a Direcção faz entre a presença destas brigadas e a chegada daqueles que esperavam a comitiva na Praça da República é inoportuna e infeliz. Inoportuna porque se esquecem que a cidade nos sábados de manhã é muito dinâmica, pelo que a cerimónia na Praça da República só iria atrapalhar ainda mais o trânsito e as condições de estacionamento, tão debilitadas mesmo sem tantos carros. Infeliz porque a presença de tanta gente no local da inauguração só veio trazer mais dignidade e solenidade ao acto em si. Não se esqueçam, são as “boas práticas”.

Terceiro equívoco. Fala-se muito no texto em Vip’s, julgo que com intenção ofensiva. E isso eu posso tomar por ofensa pessoal. Já disse que pensava ir de fato e gravata. Então eu sou Vip? Digam lá, sou Vip? Então, por querer aparecer na televisão bem vestido ao lado do senhor primeiro-ministro, do senhor do sinal, do marido da senhora vereadora, do senhor deputado já sou Vip? A imagem que ilustra no último número a inauguração vem dar-me total razão. Os engravatados estão todos sentados e com cara de importante e tirando aqueles que indiquei três ou quatro linhas acima, a verdade é que não conheço mais ninguém. Vejam lá na fotografia se os outros, todos eles sem fato e gravata, arranjaram lugar para se sentar!!! Estão é a ver se alguém se levanta. Então os que eu não conheço também serão Vip’s? Agradecia, por isso, que da próxima vez houvesse mais atenção e não se colocassem, de ânimo leve, rótulos nas pessoas. Vip??!!!! Ora francamente…

Quarto equívoco. A troca de impressões, sempre salutar, entre autarcas e população. Sem ter falado com ninguém, julgo ter havido alguma confusão na compreensão de algumas expressões. A tirada: “Cale-se sua parvalhona, nem sei quem você é” é precisamente uma dessas expressões. Acredito que as palavras terão sido: “cale-se sua sabichona, nem sei quem você é”. E digo isto porquê? Porque “a directora de um dos serviços do Hospital” mostrou nos debates entretanto ocorridos e mesmo em declarações à comunicação social saber imenso do assunto e estar demasiado bem preparada para o discutir. Não se chama “parvalhona” a quem sabe mais do que nós, pois não? Quanto ao gesto do senhor Presidente fazendo “Chiuuuu”, estou certo que tal se deve ao facto de a senhora popular, revelando alguma “falta de educação”, ter interrompido uma conversa interessante que estava a ter com o senhor primeiro-ministro. Por falar em “falta de educação” não me esqueço do Vip. Grrrrrr…

Quinto e último equívoco. Perpassa em todo o texto da Direcção um ar de inconveniência, tentando insinuar que o que se tem feito não defende os interesses da cidade. Uma injustiça, mais uma vez. Recordo que quando se falou em portagens na A23 logo o senhor presidente organizou uma manifestação automóvel que até Castelo Branco mostrou bem a força da nossa razão. Não vai acontecer mas no caso de fechar o Hospital, o Tribunal e a esquadra da PSP, estou certo que o mesmo presidente organizará uma manifestação de canoas ( o meio de transporte mais usual nos abrantinos ) por esse rio acima até à zona do Tejo internacional e com os tacos da nossa equipa de basebol mostraremos a esses governantes do PS quem manda.

Espera aí. Eu disse PS? Então mas… na Câmara não está o PS? E no Governo… também o PS? Bem, isso agora não interessa nada. Já estou a ver os senhores da Direcção a dizer: “está confuso, coitado”. Ah, ah, mas eu disse “não vai acontecer”. Ora recuem lá meia dúzia de linhas. “Não vai acontecer mas…”. Então, está ou não está? “Vip” e “confuso”, pois sim…

“Eles hádem ver”… Hádem, hádem…

Nova Aliança, 6 / 7 / 2007

3.7.07

O novo aeroporto, os erros dos alunos e o polaco renascido

30 de Maio - Rui Tavares, um senhor de pose altiva (Choque Ideológico, RTP-N), confessou ao auditório que gosta de Mário Lino. Este, ao menos, «diz o que pensa». Rui Tavares considera isso uma bênção, quer se tratem, ou não, de baboseiras ou frases sem sentido. E, desta vez, Mário Lino não só falou o que pensa como disse a verdade: a sul do Tejo existe muita pouca gente ( gente que desgraçada e estupidamente ainda não deu o salto ) e qualquer opção a sul obrigaria as pessoas a «passar o Tejo», rumo ao norte, o que seria uma tragédia uma vez que só existem duas pontes e a “distância” é enorme. Rui Tavares parte do princípio de que as «pessoas», chegadas a sul do Tejo, vão querer passá-lo porque toda a acção se presume na parte de cima. Em «baixo» o interesse é parco, em «cima» o frenesim é irresistível..

Para esta gente, o país é isto: o seu umbigo. Rui Tavares deve passar a vida a pavonear-se na sua Lisboa cosmopolita, onde existe uma Tema para adquirir as revistinhas da praxe; onde há estúdios de televisão para o Sr. Rui Tavares aliviar a sua imensa sabedoria. Essa coisa do país real, da descentralização e do combate às assimetrias é só para inglês ver. As assimetrias não só existem, como são para cumprir. Há que povoar e edificar até à exaustão todo o metro quadrado de superfície a norte de Lisboa porque, a sul, os «resistentes» hão-de capitular e, mais tarde ou mais cedo, dirigir-se para norte. É o mesmíssimo tipo de critério utilizado à escala global, e tantas vezes criticado pela esquerda do Sr. Rui, na hora de decidir investimentos e incursões a sul: o critério utilitarista e economicista. Porque o sul é pobre, tem pouca gente, tem pouco interesse, o tal “deserto”, estão a ver?!...


3 de Junho - Os erros de ortografia e construção de frases não contaram para a avaliação das provas de aferição dos 4.º e 6.º anos. Justificação do Ministério da Educação: foi de propósito. Quer dizer, não contabilizar os erros fez parte das "técnicas de avaliação". O objectivo era avaliar a "competência de interpretação". E para isso os erros seriam irrelevantes.

Um erro de ortografia pode ser, de facto, menos grave que uma interpretação torta. Não vale a pena discutir estas questões técnicas. Embora o ministério não explique como é que se avalia a interpretação de alguma coisa se não se conseguir percebê-la por erros ou falta de clareza na "construção frásica".

O que é mais questionável nesta decisão é a imagem que transmite aos alunos e à sociedade. De falta de rigor e de exigência.

Também é preciso não esquecer que as notas destes exames - apesar de não contarem para mais nada a não ser aferir o grau de conhecimento do aluno - vão ser conhecidas, dia 21 de Junho. E que lição tirará de uma nota alta um aluno que faça muitos erros de ortografia? Nenhuma que seja boa e lhe sirva para o futuro.

6 de Junho - Um ferroviário polaco que passou 19 anos em coma, Jan Grzebski, devido a um acidente que sofreu em 1988, acordou agora e achou o mundo muito diferente, tendo o seu país deixado de pertencer ao entretanto extinto Pacto de Varsóvia e passado a ser membro da NATO, bem como da União Europeia.
Progressivamente imobilizado, depois de um choque com um vagão lhe ter provocado um tumor no cérebro, Grzebski conta que ouviu os médicos dizerem que só teria mais um mês ou dois de vida, mas que afinal a mulher o salvou, graças aos cuidados que sempre lhe dispensou.

“O que hoje me surpreende é que toda essa gente anda por aí com telemóveis e nunca deixa de se queixar. Eu não me queixo de nada. Quando entrei em coma só havia nas lojas chá e vinagre, a carne era racionada e formavam-se por toda a parte bichas para a gasolina”, declarou o “ressuscitado” ao canal TVN24, evocando as suas memórias dos tempos em que o regime comunista procurava resistir ao descalabro. Aos 65 anos, sentado numa cadeira de rodas, vem contando como Gertruda, a companheira, fez as vezes de toda uma equipa de cuidados intensivos, mudando-o de posição de hora a hora, para que não desenvolvesse infecções enquanto estava acamado. “Vejo tantos produtos nas lojas que fico com a cabeça à roda”, afirma Jan Grezebski, que encontrou os quatro filhos já casados e com 11 netos.

7 de Junho – Casa cheia no Sardoal para ver representar uma das maiores actrizes portuguesas de sempre: Maria do Céu Guerra. Felizmente que ainda existem em Portugal autarquias com programas culturais. O mundo não é todo feito de basebol e canoagem…

Nova Aliança, 22 / Junho / 2007

13.6.07

O dia da Europa e as Doações

9 de Maio - A «IDEIA DE EUROPA» Este é o título do último ensaio de George Steiner, publicado, entre nós, pela Gradiva.

Steiner é um pensador contemporâneo, judeu e «europeu». «Europeu», desde logo, porque o seu percurso de vida passou e passa pelos "quatro cantos" do velho Continente (e do mundo): nasceu e cresceu em Paris, filho de pais austríacos. Estudou nas Universidades de Paris, Chicago, Harvard, Oxford e Cambridge. Vive entre a Suiça e a Inglaterra.
Além disso, George Steiner assume-se também «europeu» - designadamente, neste seu ensaio - por uma espécie de opção afectiva e ideológica. Tão ideológica (sem deixar de ser igualmente afectiva) que esta sua «Ideia de Europa» mereceu um prefácio do institucionalmente europeu José Manuel Barroso.###

Desde há algum tempo a esta parte, pelo menos, desde a institucionalização, em Maastricht, da União e com muita premência desde o último (grande) alargamento da Europa comunitária, envolto no chumbo (francês e holandês) à "Constituição" Europeia, o discurso oficial adoptado pelas Instituições passa pela divulgação de uma «Ideia de Europa».

Uma ideia identitária, uma espécie de definição do que é a Europa que se quer construir. A «Ideia de Europa» (ainda que tópica, mas, sobretudo, clara e atraente) é um objectivo e uma necessidade política da integração europeia, principalmente, no seu estádio actual. Compreende-se, portanto, a oportunidade do gosto e da sensibilidade literárias do Presidente da Comissão.

Ora, Steiner estrutura a sua «Ideia de Europa» na herança que todos nós, os "europeus", recebemos de Jerusalém e de Atenas. Importaria - se bem que não seja muito oportuno, nem necessário, por enquanto - perguntar se neste "todos nós", beneficiários da herança/génese europeia, se incluem, também, os nossos vizinhos Turcos...E, precisamente, um dos traços definidores da Europa que Steiner nos faz notar é - citando Wiliam Blake - "a santidade do pormenor diminuto".
Uma das características e riquezas do velho continente (sejam lá quais forem, em concreto, as suas fronteiras - por exemplo, para Steiner, Moscovo é já um dos subúrbios da Ásia) é precisamente a sua miríade de diferenças, detectada em aparentes pormenores (costumes, organizações e tradições sociais, económicas, até micro-climas, etc.) que, bem vistas as coisas, acabam mesmo por ser decisivos...pormaiores. Essa "santidade do pormenor diminuto" (sobretudo, quando comparada com outros espaços e continentes) será o génio da Europa: "É o génio da diversidade linguística, cultural e social, de um mosaico pródigo que muitas vezes percorre uma distância trivial, separado por vinte quilómetros, uma divisão entre mundos" - escreve Steiner, salientando o contraste com a "terrível monotonia que se estende do ocidente de Nova Jérsia às montanhas da Califórnia, (...) aquela avidez de uniformidade". Talvez também por isso, por causa dos pormenores, "a Europa é feita de cafetarias, de cafés. Estes vão da cafetaria preferida de Pessoa, em Lisboa, aos cafés de Odessa, frequentados pelos gangsters de Isaac Babel", legitimando-se, por isso, um dos traços mais impressivos, para Steiner, desta Europa: "Desenhe-se o mapa das cafetarias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da «ideia de Europa»".

A falta de uniformidade (et pour cause, esse géniozinho europeu) também potencia, contudo, aquilo que de mau tem perseguido historicamente esta Europa; é apenas um dos lados da moeda (... europeia, do Euro que, curiosamente, não merece grande atenção, nem relevo, por parte de Steiner, nesta sua construção da identidade europeia!):

Assim, " os ódios étnicos, o nacionalismo chauvinista, as reivindicações regionais têm sido o pesadelo da Europa (...). A disseminação mundial da língua anglo-americana, a padronização tecnológica da vida quotidiana, a universalidade da Internet, são legitimamente considerados grandes passos rumo a uma eliminação de fronteiras e ódios antigos". E, acrescenta-se, sublinhando-se a incontornável atracção, a inolvidável referência americana, hoje em dia, da «Ideia de Europa»: "O sucesso fantástico do modelo americano, do seu federalismo que abarca distâncias imensas e climas diversos, apela á imitação. Jamais a Europa deverá sucumbir novamente à guerra intestina".

Também por isto, estranha-se o esquecimento de Steiner relativamente a Roma.
No rol daquela herença genética da Europa, da sua ideia e identificação, a par de Jerusalém e de Atenas, Roma terá também o seu papel. Quanto mais não seja pelo engenhoso legado de pragmatismo e de integração que nos deixou - uma dimensão que nos falta, muitas vezes, a nós "europeus" contemporâneos (e, sobretudo, a nós "europeus portugueses").
As vias romanas aproximaram e integraram regiões, comunidades, povos, transpondo e quebrando eficazmente as fronteiras que ainda vão vigorando, hoje em dia. É certo que o velho adágio popular não nos diz que todos os caminhos nos levam a ....Bruxelas ; porém, apesar de tudo, não será assim tão grande a distância entre esta capital e Roma! é o título do último ensaio de George Steiner, publicado, entre nós, pela Gradiva. O autor é um pensador contemporâneo, judeu e «europeu». «Europeu» porque o seu percurso de vida passou e passa pelos "quatro cantos" do velho Continente (e do mundo): nasceu e cresceu em Paris, filho de pais austríacos. Estudou nas Universidades de Paris, Chicago, Harvard, Oxford e Cambridge. Vive entre a Suiça e a Inglaterra. Além disso, George Steiner assume-se também «europeu» - designadamente, neste seu ensaio - por uma espécie de opção afectiva e ideológica.

Uma das características e riquezas do velho continente ( sejam lá quais forem, em concreto, as suas fronteiras - por exemplo, para Steiner, Moscovo é já um dos subúrbios da Ásia ) é precisamente a sua miríade de diferenças, detectada em aparentes pormenores ( costumes, organizações e tradições sociais, económicas, até micro-climas, etc.) que, bem vistas as coisas, acabam mesmo por ser decisivos...pormaiores. Essa "santidade do pormenor diminuto" (sobretudo, quando comparada com outros espaços e continentes) será o génio da Europa: "É o génio da diversidade linguística, cultural e social, de um mosaico pródigo que muitas vezes percorre uma distância trivial, separado por vinte quilómetros, uma divisão entre mundos" - escreve Steiner, salientando o contraste com a "terrível monotonia que se estende do ocidente de Nova Jérsia às montanhas da Califórnia, (...) aquela avidez de uniformidade". Talvez também por isso, por causa dos pormenores, "a Europa é feita de cafetarias, de cafés. Estes vão da cafetaria preferida de Pessoa, em Lisboa, aos cafés de Odessa, frequentados pelos gangsters de Isaac Babel", legitimando-se, por isso, um dos traços mais impressivos, para Steiner, desta Europa: "Desenhe-se o mapa das cafetarias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da «ideia de Europa".

A falta de uniformidade também potencia, contudo, aquilo que de mau tem perseguido historicamente esta Europa; é apenas um dos lados da moeda (... europeia, do Euro que, curiosamente, não merece grande atenção, nem relevo, por parte de Steiner, nesta sua construção da identidade europeia!):

Assim, " os ódios étnicos, o nacionalismo chauvinista, as reivindicações regionais têm sido o pesadelo da Europa (...). A disseminação mundial da língua anglo-americana, a padronização tecnológica da vida quotidiana, a universalidade da Internet, são legitimamente considerados grandes passos rumo a uma eliminação de fronteiras e ódios antigos". E, acrescenta-se, sublinhando-se a incontornável atracção, a inolvidável referência americana, hoje em dia, da «Ideia de Europa»: "O sucesso fantástico do modelo americano, do seu federalismo que abarca distâncias imensas e climas diversos, apela à imitação. Jamais a Europa deverá sucumbir novamente à guerra intestina".

Também por isto, estranha-se o esquecimento de Steiner relativamente a Roma.
No rol daquela herença genética da Europa, da sua ideia e identificação, a par de Jerusalém e de Atenas, Roma terá também o seu papel. Quanto mais não seja pelo engenhoso legado de pragmatismo e de integração que nos deixou - uma dimensão que nos falta, muitas vezes, a nós "europeus" contemporâneos (e, sobretudo, a nós, "europeus portugueses").
As vias romanas aproximaram e integraram regiões, comunidades, povos, transpondo e quebrando eficazmente as fronteiras que ainda vão vigorando, hoje em dia. É certo que o velho adágio popular não nos diz que todos os caminhos nos levam a ....Bruxelas ; porém, apesar de tudo, não será assim tão grande a distância entre esta capital e Roma!


29 de Maio - «O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais declarou ontem euforicamente em Coimbra que a fuga ao fisco já não é "desporto nacional". "Desporto nacional", agora, é a caça ao contribuinte miúdo.”

A coisa já vem de antes de 2003 e resistiu heroicamente à extinção do Imposto sobre Sucessões e Doações, mantendo-se, como certas células terroristas, "adormecida" na manga do Ministério das Finanças. É uma espécie de arma secreta, tão secreta que Sócrates ainda em Janeiro negava veementemente na AR a sua existência.

Se você, leitor, ou eu quisermos dar a um filho ou neto dinheiro para um leitor de DVD ou uma bicicleta no dia do aniversário ( ou só para as propinas da Faculdade ) temos que, se a prenda for de valor igual ou superior a 500 euros, preencher um papel nas Finanças ( no caso das propinas teremos que lá ir todos os meses sob pena de multa ) para que o dr. Teixeira dos Santos saiba. Não há lugar a imposto, é apenas curiosidade do dr. Teixeira dos Santos. Já se a prenda for um vestido para a mulher, ou um fato para o marido, ou relógio para o irmão ou o sobrinho, o dr. Teixeira dos Santos quer 10% dela, da prenda.

Nova Aliança, 8 / 06 / 2007

31.5.07

A Independente e a "anedota"

2 de Maio – António Costa, no ano passado, nunca chamou a atenção para as condições climatéricas anormalmente favoráveis. Muito pelo contrário, o ministro da Administração Interna aceitou sem advertências ou esclarecimentos os elogios que foram sendo feitos ao desempenho do Governo no combate aos incêndios.
Este ano, pelo sim e pelo não, Costa alerta para o facto de o risco ser mais elevado. Afinal, esclarece o MAI, «temos obrigação de saber que os resultados alcançados no ano passado não são ainda sustentáveis». Pois temos. Não teria ficado mal no final do Verão de 2006 salientar isso mesmo, i.e. que o Governo tinha beneficiado de condições climatéricas especialmente favoráveis. Mas não. Na altura Costa preferiu cavalgar a onda do êxito no combate aos incêndios, mesmo que a realidade fosse mais complexa.

3 de Maio - Não se percebe a razão e critério do encerramento da Universidade Independente! É que, como se demonstrou, está muito mais à frente que qualquer outra universidade. Vejamos: está aberta nas férias do Verão; passa diplomas aos Domingos; aceita candidatos sem documentação comprovativa das habilitações,
confiando na boa fé dos candidatos (princípio humanista); maximiza a potencialidade científica dos seus docentes, ao colocá-los a reger 4 cadeiras (ao mesmo tempo que o regente é assessor no mesmo Governo onde um dos alunos é Secretário de Estado); permite que uma mesma pessoa, num só ano, faça duas licenciaturas; convida os seus antigos alunos, que nunca conheceram, a ir dar aulas para lá; estabelece planos de curso pessoais "ad-hoc", sem os documentar, obviamente para poupar nos custos do papel e impressão; possibilita a apresentação de teses finais sem que as mesmas fiquem guardadas no arquivo a ocupar espaço e recursos; forma alunos que, no futuro, ascendem a primeiros-ministros. Como justificar o encerramento de uma universidade assim, cujo mal é, pelos vistos, confiar nas pessoas, poupar nos custos e maximizar os seus recursos? Juntemo-nos e lutemos contra o encerramento da UNI. Passem este mail até chegar às mão de Mariano, O Gago, e pode ser que ainda se consiga evitar o pior.

5 de Maio – Resposta de um aluno português num teste de História: “D.Dinis fundou em 1290 a INDEPENDENTE que era uma universidade aberta a todos”. O “eduquês” dirá que o aluno compreende a realidade e acerou em cheio na data.

7 de Maio - Como se já não bastasse esta irritação, lá chego ao quadro 408 do Anexo A (foi a mesma coisa no ano passado, agora me lembro), onde cabem, para efeitos de dedução à matéria colectável, as "despesas de valorização profissional de juízes". De juízes?!... Mas então só os juízes é que têm despesas de valorização profissional?!... Só eles é que têm direito a deduzir no imposto o que gastam para se irem valorizando profissionalmente?!... E os outros?!... Os engenheiros, os psicólogos, os médicos, os professores universitários, eu?!... Por que raio não posso eu deduzir nada das centenas e centenas de euros que gasto por ano em livros, em assinaturas de revistas científicas, em seminários e congressos?!... Porquê esta cláusula especial para os juízes, só para os juízes?!... Por alma de quem lhes acrescentou o Governo mais este privilégio aos seus já interessantes "direitos especiais" (cf. Lei 143/99, de 31 de Agosto)?!... "Direitos especiais" em matéria de gastos com valorização profissional?!...
Peço desculpa, mas eu também quero. Também mereço. E, como eu, muitos profissionais com ofícios de enorme interesse público (os professores não o são?...) que tanto gastam do seu bolso para se valorizarem. E que, por acaso, até ganham muito menos (em ordenado e em regalias) do que a maior parte dos juízes...

19 de Maio – “Um professor de Inglês, que trabalhava há quase 20 anos na Direcção Regional de Educação do Norte (DREN), foi suspenso de funções por ter feito um comentário – que a directora regional, Margarida Moreira, apelida de insulto – à licenciatura do primeiro-ministro, José Sócrates.
A directora regional não precisa as circunstâncias do comentário, dizendo apenas que se tratou de um "insulto feito no interior da DREN, durante o horário de trabalho". Perante aquilo que considera uma situação "extremamente grave e inaceitável", Margarida Moreira instaurou um processo disciplinar ao professor Fernando Charrua e decretou a sua suspensão. "Os funcionários públicos, que prestam serviços públicos, têm de estar acima de muitas coisas. O sr. primeiro-ministro é o primeiro-ministro de Portugal", disse a directora regional, que evitou pormenores por o processo se encontrar em segredo disciplinar. Numa carta enviada a diversas escolas, Fernando Charrua agradece "a compreensão, simpatia e amizade" dos profissionais com quem lidou ao longo de 19 anos de serviço na DREN (interrompidos apenas por um mandato de deputado do PSD na Assembleia da República).

No texto, conta também o seu afastamento. "Transcreve-se um comentário jocoso feito por mim, dentro de um gabinete a um "colega" e retirado do anedotário nacional do caso Sócrates/Independente, pinta-se maldosamente de insulto, leva-se à directora regional de Educação do Norte, bloqueia-se devidamente o computador pessoal do serviço e, em fogo vivo, e a seco, surge o resultado: "Suspendo-o preventivamente, instauro-lhe processo disciplinar, participo ao Ministério Público", escreve.

A directora confirma o despacho, mas insiste no insulto. "Uma coisa é um comentário ou uma anedota, outra coisa é um insulto", sustenta Margarida Moreira. Sobre a adequação da suspensão, a directora regional diz que se justificou por "poder haver perturbação do funcionamento do serviço". "Não tomei a decisão de ânimo leve, foi ponderada", sublinha. E garante: "O inquérito será justo, não aceitarei pressões de ninguém. Se o professor estiver inocente e tiver que ser ressarcido, será”.

Neste momento, Fernando Charrua já não está suspenso. Depois da interposição de uma providência cautelar para anular a suspensão preventiva e antes da decisão do tribunal, o ministério decidiu pôr fim à sua requisição na DREN. Como o professor, que trabalhava actualmente nos recursos humanos, já não se encontrava na instituição, a suspensão foi interrompida. O professor voltou assim à Escola Secundária Carolina Michäelis, no Porto. O PÚBLICO tentou ontem contactá-lo, sem sucesso.

No entanto, na carta, o professor faz os seus comentários sobre a situação. "Se a moda pega, instigada que está a delação, poderemos ter, a breve trecho, uns milhares de docentes presos políticos e outros tantos de boca calada e de consciência aprisionada, a tentar ensinar aos nossos alunos os valores da democracia, da tolerância, do pluralismo, dos direitos, liberdade e garantias e de outras coisas que, de tão remotas, já nem sabemos o real significado, perante a prática que nos rodeia." In Publico on-line, 19/5/07


Nova Aliança, 25 / 5 / 2007

20.5.07

O Supremo Tribunal de Justiça, o Défice e a Universidade Independente

10 de Abril – “É irrelevante que o facto divulgado seja ou não verídico para que se verifique a ilicitude a que se reporta este normativo, desde que, dada a sua estrutura e circunstancialismo envolvente, seja susceptível de afectar o seu crédito ou a reputação do visado”, lê-se no acórdão de 8 de Março, subscrito pelos conselheiros Salvador da Costa, Ferreira de Sousa e Armindo Luís. O Sporting processou o Público em 2001, mas, realizado o julgamento, os jornalistas foram absolvidos. O clube, então presidido por Dias da Cunha, recorreu da decisão e, em Setembro de 2006, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a decisão da primeira instância. No entanto, após novo recurso, o Supremo veio agora contrariar as duas decisões anteriores. Apesar de o teor da notícia ter sido dado como provado, os conselheiros concluíram que os jornalistas agiram de modo censurável do ponto de vista ético-jurídico, entendendo que o direito à honra se sobrepõe ao dever de informar – decisão que deixou os responsáveis do jornal diário perplexos. “Atendendo à ênfase que a Declaração universal dos Direitos do Homem dá ao direito à honra e à reputação, expressando que ninguém sofrerá ataques em relação a ela, no confronto com a menor ênfase dada ao direito de expressão e de informação, a ideia que resulta é a de que o último é limitado pelo primeiro”, lê-se no acórdão do STJ. Assim, os conselheiros concluem que os jornalistas “agiram na emissão da notícia em causa de modo censurável” com a publicação ilícita e culposa da notícia. O Sporting pedia uma indemnização de cerca de 500 mil euros, mas neste ponto os juízes determinaram um sétimo do valor pretendido: 75 mil euros por danos não patrimoniais. Entenderam os conselheiros que “não havia em concreto interesse público na divulgação do que foi divulgado”, situação que ofendeu o “crédito e o bom-nome do clube de futebol, que disputa a liderança da primeira liga”.


Podem beliscar-se à vontade. A história que acabaram de ler aconteceu mesmo. Importam-se os senhores conselheiros de explicar o que se pode ou não publicar acerca dos clubes que disputam a liderança da primeira liga? E aos outros clubes também se aplica este princípio da suposta honra sobre a verdade dos factos? E aos cidadãos?
No fundo, o que o Supremo Tribunal defende nesta passagem é que o direito ao bom nome é o direito a uma imagem pública falsa. O que queremos dizer quando dizemos que uma pessoa tem direito ao "bom nome"? De acordo com a interpretação do Supremo, o direito ao "bom nome" é o direito a uma boa reputação. Acontece que a reputação de uma pessoa resulta da avaliação que os outros fazem dela. Resulta das decisões dos outros. Declarar que uma pessoa tem direito a uma boa reputação é o mesmo que declarar que os outros não devem ter o direito de pensar e de avaliar. O que a ser levado a sério implicaria que a reputação pública deixaria de ter qualquer valor porque todos perceberiam que uma reputação não fundamentada não serve para nada. Teríamos reputações de fachada e viveríamos num mundo de hipócritas ou de robots. As reputações têm valor enquanto indicador da fiabilidade de uma pessoa precisamente porque existe liberdade para que possam ser postas em causa.


12 de Abril - De acordo com informações prestadas pelo próprio Ministério das Finanças, as “receitas extraordinárias” de 2006 ascenderam a mais de 2.121 milhões de euros, a saber: antecipação de impostos sobre o tabaco (300 milhões), vendas de património(439 milhões), dividendos extraordinários e antecipados(REN-60 milhões), dividendos extraordinários (GALP-124 milhões), recuperações de créditos líquidas de adicionais da operação de titularização(1.198 milhões). Estas receitas extraordinárias equivalem a 1,4% do PIB. Não fossem essas receitas extraordinárias, que Sócrates e os socialistas tanto criticaram a Manuela Ferreira Leite, e o défice de 2006 seria 8.176 milhões de euros, correspondentes não a 3,9%, mas a 5,3% do PIB. Este valor é superior ao valor apurado para 2004, era Bagão Félix Ministro das Finanças, que foi de 5,2% ( 2,9% com receitas extraordinárias ).

14 de Abril – O que fazer quando se “tem o rabo preso”? Dizer: "Ainda bem que me faz essa pergunta"; Elevar o tom de voz; Mostrar indignação; Dizer quanto valoriza a aprendizagem ao longo da vida; Mostrar um documento qualquer. Mesmo que ninguém consiga ler, credibiliza. Pode ser a Certidão de Nascimento. Se ninguém perceber o que é, impressiona à mesma; Dar a entender que isto é uma questão de invejas. Todos os pontos favoráveis são mérito do Primeiro-Ministro, que até se licenciou numa universidade elogiada pelo Ministério do Ensino Superior. Todos os pontos desfavoráveis são culpa da burocracia da Independente, que até foi fechada pelo Ministério do Ensino Superior.

18 de Abril – O caso da Universidade Independente é um caso “normal”: Sócrates acha “normal” que a data da sua "licenciatura" reporte a um domingo; Sócrates acha “normal” que o mesmo professor lhe tenha dado 4 cadeiras num único ano (de um total de 5); Sócrates acha “normal” que esse mesmo professor tenha sido posteriormente por si nomeado para cargos públicos; Sócrates acha “normal” que esse mesmo professor seja suspeito da prática de diversos crimes, o que terá inclusivamente levado à sua constituição como arguido em processos-crime; Sócrates acha “normal” que existam diversos registos na Assembleia da República, alegadamente assinados pelo próprio com a mesma data, com informações contraditória acerca das suas habilitações; Sócrates acha “normal” o uso do título de engenheiro no seu currículo, mesmo sabendo que não era possuidor do mesmo; Sócrates acha “normal” ter tomado posse na qualidade de engenheiro, tendo jurado cumprir as funções para as quais havia sido eleito, sabendo que não era engenheiro.
Perante todos estes factos, claramente indiciadores de que terá havido favorecimento pessoal, continua o Procurador da República a assobiar para o ar como se nada fosse com ele. Perante todos estes factos, reveladores de uma crise política profunda, continua o Presidente da República a fingir que não é nada com ele.
Evidentemente, “anormais” somos todos nós…

21 de Abril – Num texto publicado no Espresso, José Alberto Carvalho justificou o tom da entrevista com a notável expressão: “Fizemos o que tinha de ser feito!” Ele tem toda a razão: era necessário escolher as questões que menos dano causassem, era necessário ser constantemente interrompido pelo entrevistado, era necessário fazer passar a “mensagem” do entrevistado, etc. Felizmente, os repórteres que correram atrás de Carmona Rodrigues na inauguração do túnel foram bem mais “agressivos”.

22 de Abril – O Tribunal que decide prender o Sargento por “raptar” a criança é o mesmo Tribunal que decide entregar a criança “raptada” ao “raptor”.

23 de Abril - António José Morais deu uma reveladora e interessante entrevista ao DN.
A avaliar por aquilo que diz de si próprio, se o teor das aulas de António José Morais for equivalente à sua concepção de Portugal e de si mesmo é melhor que se dedique ao ensino por correspondência ou à cultura da beterraba:

”Eu era uma referência do PS em Lisboa. Tínhamos acabado de ganhar a concelhia. Foi no Altis que fui apresentado a Armando Vara. Ele já estava no Governo. (...) Em 1995 eu tinha uma carreira política. Toda a gente falava de mim. Eu era a estrela emergente do PS em Lisboa. Um putativo candidato a ministro e não a director-geral. É natural que Armando Vara, quando precisou de um engenheiro, se tenha lembrado de mim”.

25 de Abril – Abriu o túnel do Marquês de Pombal. Agora só falta o do Terreiro do Paço.

Nova Aliança, 11 / Maio / 2007

30.4.07

A nota lançada ao domingo, o tabaco na AR e Scarlett Johansson

31 de Março – O semanário Expresso noticia na sua edição de hoje que uma das notas do senhor Sócrates na Universidade Independente terá sido lançada a um domingo. Dificilmente encontraremos eficiência maior. Não se arranja aí uma comendazinha para o diligente funcionário? Olhem que vem aí o 10 de Junho…

1 de Abril – Perante a notícia que serve de capa ao semanário de Balsemão, os directores da Rádio Renascença e do Público confessam ter recebido telefonemas com o objectivo de alterar as referências a tal notícia quer nos alinhamentos dos noticiários da rádio, quer no destaque dado na imprensa escrita. O que se chama a isto?

2 de Abril – Que conclusões tirar do relatório do Tribunal de Contas? É, no mínimo, escandaloso que as verbas gastas com assessores, gabinetes e outros penduras dos últimos três governos pudessem pagar quatro Otas. Numa altura em se continuam a pedir sacrifícios aos portugueses, é chocante a vergonha com que se continua a nomear os amigos para isto e para aquilo.

3 de Abril – Perante o diploma que proíbe o fumo no edifício da Assembleia da República, alguns deputados do Partido Socialista já vão avisando que não irão fumar para o exterior. Conclusão que todos deveremos tirar: as leis só servem para os outros cumprirem.

4 de Abril – Ecos do último Benfica-Porto. Os sessenta e três mil adeptos do clube da casa foram revistados à entrada, os três mil que vieram do Norte foram convidados a passar por cima dos torniquetes e não foram revistados. Que se conclui? Que é mais grave uma manifestação âs portas de S. Bento, onde a polícia varre tudo à bastonada do que a prática de selvajaria dentro de um estádio.

6 de Abril – Apesar da pobreza franciscana dos cartazes cinematográficos na cidade, lá vou vendo um filme ou outro. O de Woody Allen, por exemplo. No filme, a personagem de Scarlett Johansson é uma jornalista em início de carreira que, visitada por um fantasma e aconselhada por ele, inicia investigação de um serial killer londrino. A investigação leva Scarlett aos braços de um aristocrata local que é o principal suspeito dos crimes cometidos. Não revelo o final, mas revelo os entretantos: Scarlett é um pequeno desastre porque caiu na tentação de ter piada. Pior: de imitar os tiques de Woody, como se os tiques de Woody funcionassem por osmose.

Não funcionam. Pior: quando Woody entra em cena, a cena é inteiramente dele. E se não fosse Woody Allen, qualquer homem seria mais convincente do que Scarlett. Porquê? Razão simples: Scarlett é demasiado bela para ter piada. E o humor só existe, e praticamente só existe no masculino, porque é ferramenta evolutiva indispensável para que um “macho” conquiste a sua donzela.

Christopher Hitchens, colunista da "Vanity Fair", também reflectiu sobre esse assunto em número recente da revista. Por que motivo as mulheres não têm sentido de humor? Ou, pelo menos, um sentido de humor comparável aos homens? Na sua coluna, Hitchens arranha a explicação sexual, mas acaba por escolher o papel sério da maternidade. O humor só existe por confronto com a morte; e esse confronto está interdito às mulheres, que ao gerarem vida e ao assumirem um papel de protecção e autoridade, não se podem dar ao luxo de desperdiçar cinismo e absurdo por aí.

E as mulheres, precisarão elas de ter piada? Não, as mulheres não precisam de ter piada. Não é por acaso que, numa das cenas antológicas do filme, Woody lhe pede expressamente para ela deixar as piadas para ele. Concordo inteiramente. Uma mulher como Scarlett não precisa de ter piada. Basta-lhe, simplesmente, aparecer. Porque, como dizem os brasileiros com genuína sabedoria, Scarlett Johansson já é, ela mesma, a maior gracinha que existe.

Nova Aliança, 27 / Abril / 2007

10.4.07

O "controle" do senhor Sócrates e o cruzamento de dados

11 de Março - Salazar despachava diariamente com o director da PIDE. Caetano não despachava com o director da PIDE/DGS. Durante trinta anos de democracia nenhum primeiro-ministro despachou em pessoa com qualquer chefe de qualquer polícia. Tudo isto irá mudar. Uma lei já anunciada vai pôr a PSP, a GNR, a PJ e o SEF sob a autoridade de um secretário-geral para a Segurança Interna, com o estatuto de secretário de Estado, que despachará directamente com o senhor Sócrates. Como de costume, esta organização foi copiada. Desta vez, do modelo espanhol. Com duas diferenças. Primeira, em Espanha, o "secretário-geral" está subordinado ao ministro do Interior e não ao presidente do Conselho. E, segunda, em Espanha o terrorismo da ETA e a imigração islâmica teoricamente justificam a necessidade de um único centro de comando.
Em Portugal, nenhum perigo imediato exige que as polícias passem a depender de Sócrates. Pior ainda: o SIRP, que superintende e coordena o Serviço de Informações de Segurança (SIS) e o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), dois serviços secretos, também ficará sob a tutela do primeiro-ministro. E a tudo isto, António Costa juntou dois novos meios de fiscalização e vigilância. O bilhete 4 em 1, que reúne o bilhete de identidade, o cartão de contribuinte, o cartão da Segurança Social e o cartão de utente do SNS. E o cartão que reúne a carta de condução, o livrete e o título de propriedade do automóvel.

Dados a cruzar, tendo como fonte o jornal “Público”:

- Identificação e cadastro contributivo das bases de dados da CGA, ADSE, ADM, SSMJ, SAD da GNR e da PSP, DGITA e IIES;
- Nacionalidade, residência e estado civil das bases de dados do Ministério da Justiça;
- Benefícios sociais das bases de dados da CGA, ADSE, ADM, SSMJ, SAD da GNR e da PSP, ISS e IIES;
- Vínculo laboral com a administração pública da base de dados da DGAP, do ISS e do IESS; - Rendimentos da base de dados da DGITA;
- Património mobiliário e imobiliário sujeito a registo das bases de dados do Ministério da Justiça;
- Situação escolar dos alunos, relativamente à frequência e aproveitamento;
- Obrigações acessórias, designadamente, início, reinício, alteração, suspensão e cessação da actividade, das bases de dados da DGITA, ISS, IESS e Ministério da Educação.

Bases de dados a cruzar:

- Subscritores, pensionistas e outros beneficiários da Caixa Geral de Aposentações (CGA);
- Beneficiários da ADSE;
- Beneficiários da Assistência na Doença aos Militares das Forças Armadas (ADM);
- Beneficiários dos Serviços Sociais do Ministério da Justiça (SSMJ);
- Beneficiários da Assistência na Doença (SAD) ao pessoal da GNR e da PSP;
- Funcionários públicos e agentes administrativos da Direcção-Geral da Administração Pública (DGAP);
- Identificação dos contribuintes fiscais da Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros (DGITA);
- Identificação civil, residência de estrangeiros e registo predial e automóvel, do Ministério da Justiça;
- Contribuintes e beneficiários do Instituto da Segurança Social (ISS) e do Instituto de Informática e Estatística da Solidariedade (IIES).

Quem começa por ter acesso:

- Todas as "gestoras" das bases de dados referidas anteriormente;
- Direcção-Geral das Contribuições e Impostos;
- Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo;
- Inspecção-Geral de Finanças;
- Instituto da Segurança Social, nomeadamente através do Centro Nacional de Pensões;
- Centro Nacional de Protecção contra os Riscos Profissionais;
- Solicitadores de Execução.

12 de Março: Parece, pois, pretender policiar-se a vida dos funcionários públicos. Convém recordar que o próprio governo, por definição constitucional, é o órgão máximo da administração, "patrão" da dita função pública. Isto será feito através de "cruzamento de dados" a que, dadas as condições promíscuas em que tudo opera em Portugal, acabarão por ter acesso pessoas e entidades que originariamente não deveriam ter. Mais uma vez quem se pretende atingir são os funcionários públicos. Esta obsessão segregacionista do governo e a persistência em apoucar a função pública como se fosse toda uma choldra inútil a extinguir sumariamente, diz muito sobre o sentido de Estado do governo, que alguns apelidam de “soviético”. Será?


Nova Aliança, 31 / 3 / 2007

Correia de Campos, a violência sobre os professores e a História da Europa

26 de Fevereiro - Correia de Campos, ministro da Saúde, relacionou hoje a diminuição do número de mortes nas estradas com o aumento do preço dos combustíveis. Era suposto, pela expressão do ministro, que a afirmação revelasse o seu fino sentido de humor. Apenas fez lembrar o ministro do Ambiente de Cavaco, Borrego. Um governante não deve cair pelo seu mau gosto. Mas pode cair apesar do seu mau gosto. Correia de Campos, a esta hora, deve estar a caminho das urgências. Pode ser que chegue a tempo.

27 de Fevereiro - A verdade é que a Madeira está para o continente como Portugal está para a União Europeia. A única diferença é que a Madeira tem o mesmo líder há 30 anos, o qual tem sabido "sacar" tudo o que pode para a região, ao invés dos sucessivos governos portugueses que insistem em agachar-se perante a Comissão Europeia e demais instâncias comunitárias. Para comprovar o que digo, experimenta substituir no teu texto Madeira por Portugal e Portugal por UE.

1 de Março - Grande protesto pelo país fora contra a violência sobre os professores. Na minha modesta opinião, incompreensível. Durante anos, a «escola centrada no aluno» e os mestres das «ciências da educação» transformaram as criancinhas em monstros irresponsáveis, ignorantes e prepotentes. Quando uma reportagem televisiva mostrou – com imagens cruas – exemplos dessa violência exercida sobre professores pelos alunos do secundário, logo algumas boas consciências protestaram sim, mas contra a captação dessas imagens, não contra a violência, contra «o estatuto do aluno» e outras alegrias do sistema escolar. A escola «centrada no aluno» é uma festa para os sentidos, mas pouco edificante quer em matéria disciplinar quer em matéria científica ou pedagógica, com técnicos do Ministério da Educação que têm das escolas uma vaga ideia, apenas uma «recordação teórica», no fundo uma visão de poltrona. A escola do “eduquês” quer ignorar palavras como «disciplina», «autoridade» e «recompensa». O aluno é o «bom selvagem». Têm aí o que criaram. Aguentem-se…


4 de Março - «A intervenção de José Sócrates, sabe o EXPRESSO, foi decisiva para que Correia de Campos participasse no debate (Prós & Contras). Foi o primeiro-ministro que lhe deu instruções para aceitar o convite e definiu os moldes em que esta intervenção ocorreria. O ministro não estaria na primeira parte do programa, deixando aos técnicos o palco das explicações.»
EXPRESSO, 3 de Março

5 de Março - A importância que têm alguns verbos em dois títulos do Diário de Notícias:

«120 camiões por hora antecipam acessos à Ota»
«Estudar nova localização atrasará novo aeroporto em três anos»

Eis o DN sempre, sempre ao serviço da nação. Não seria de pedir logo o cartão partidário?...

7 de Março - "The futile top model protegée of an aging fashion designer is forced by circumstances to come into her own as a woman of the world. Intriguing but ultimately incomplete, amateurish melodrama from a director who ought to know better; there’s a strong woman’s picture plot and great performances lost in incomprehensible plotting, inept handling and poor photography (shot on digital videMarcadores: subsidio-dependênciaO ICAM deu 648.500 euros ao filme “Vanitas” de Paulo Costa. Teve 493 espectadores. Dá 1315 euros por cada um. Mil trezentos e quinze euros, por extenso. Défice? Desperdício? Naaaaa. País rico, só pode.

8 de Março – Alguém se lembrou agora de um livrinho único de História da Europa. Já imagino as crianças alemãs, portuguesas, espanholas e italianas a festejar versões comuns sobre tudo o que nos divide. Como é evidente, já existe um modelo franco-alemão a servir de inspiração. Em geral, trata-se de uma operação de limpeza muito adequada. Ficaríamos todos felizes e unidos pela mesma constituição e pelo mesmo manual de história da Europa. Felizmente que os dinamarqueses, os suecos e os checos já disseram que não estão disponíveis, ao contrário da Espanha, desejosa de mostrar que existe. Que haja um manual sobre a Europa, distribuído pelas escolas para sensibilizar os jovens e explicar as instituições europeias, sim; mas pormo-nos de acordo uns com os outros e limparmos cirurgicamente da História as vergonhas de cada um, parece-me já um exagero.

9 de Março – Desde manhã que nos lembram ser hoje o "dia internacional da mulher". Esta absurda convenção faz tanto sentido como outros "dias" quaisquer. Os que julgam que com este folclore unem, limitam-se a separar mais um bocadinho. O que segrega as pessoas é a bolsa, o berço, a cabeça de cada um e o politicamente correcto das "quotas". O feminismo exacerbado e disparatado, os "dias de" e o ramo de flores ou a paparoca de circunstância são apenas faces da mesma velha misoginia. Um ser humano é um ser humano que é um ser humano. Não é mais ou menos isso por ser um homem ou uma mulher ou o que ele decidir ser.

Nova Aliança, 19 / 3 / 2007

5.3.07

A Bailarina Fascista

17 de Fevereiro - Leio nos jornais do dia que, por toda a Europa, hindus de nacionalidades várias prometem contestar com vigor as intenções da ministra da Justiça alemã em criminalizar a exibição da suástica. Para a ministra, a suástica representa Hitler, o Terceiro Reich e seus projectos de dominação imperial e rácica. Para os hindus, a suástica é um símbolo milenar de paz e serenidade. Deve a União Europeia, presidida actualmente pela Alemanha, proibir o símbolo da paz e da serenidade para os hindus?

18 de Fevereiro - Em Londres, segundo parece, uma bailarina do English National Ballet, Simone Clarke, afirmou ser também membro do British National Party, um grupo de extrema-direita ferozmente antiimigração. Simone, 36, namora com um dançarino cubano, imigrante, descendente de chineses. A “salada russa” perfeita. Nada disso impediu as brigadas de irromperem pelo teatro onde Simone dançava o clássico "Giselle", insultando a bailarina e exigindo sua demissão dos palcos. Simone continuou a dançar, com notável profissionalismo, apesar dos insultos. A companhia de bailado preferiu não comentar.

19 de Fevereiro – A companhia fez bem. Não é fácil comentar a loucura: uma pessoa acaba confundindo-se com ela. E se os hindus estão errados do ponto de vista iconográfico - o símbolo nazista não é exactamente igual às suásticas das religiões dármicas - o que espanta nos protestos londrinos é a evidente selvajaria das brigadas. Sim, eu entendo que uma "bailarina fascista" é tão improvável como Saddam Hussein de biquini em concurso de beleza para misses: existe na combinação um choque visual profundo, como se a grosseria de Hitler fosse incompatível com a subtileza e a elegância do "Quebra-Nozes", que Simone dançou meses atrás (com aplausos da crítica).

Mas essa não é a questão. E não é a questão porque a ideia de punir artisticamente um fascista, ou um comunista, ou um extremista de ideologia difusa, demonstra apenas a covardia de quem o faz.

20 de Fevereiro - Cobardia real: em Londres, as brigadas insultaram quem não se podia defender. Pior: quem exercia a sua arte em palco, um acto de humilhação que só define quem o pratica. A menos, claro, que o "fascismo" da sra. Clarke não se limite às suas ideias políticas e seja exibido na forma como dança: como executa o "demi-plié", como faz o "retiré", como arrisca no "arabesque", pondo a plateia a salivar com desejos tirânicos de invadir a Polónia. Haverá um ballet fascista e ninguém avisou?

Mas a cobardia é também intelectual: se a liberdade de expressão é uma benesse, ela implica aceitar vozes discordantes que devem ser toleradas, ou ignoradas, ou debatidas --e, em casos extremos, denunciadas por pessoas concretas que se sintam atingidas no seu bom-nome. Existem tribunais para isso. Mas nenhuma sociedade livre será capaz de sobreviver pela criminalização de todas as opiniões que o "senso comum" maioritário considera ofensivas. Proibir é a atitude preguiçosa do tirano menor que, incapaz de tolerar, ignorar ou refutar intelectualmente uma opinião, prefere criminalizá-la.

O gesto é perigoso: ele transforma o extremista em mártir, e o mártir em herói. O caso recente do historiador David Irving, preso e entretanto libertado na Áustria, ilustra o ponto: em 2000, Irving ficou com a reputação intelectual desfeita, ao perder em tribunal a acção contra Deborah Lipstadt, historiadora que o acusara de ser um negacionista do Holocausto. A prisão recente serviu apenas para reabilitar Irving, como já tinha acontecido na década de 1980 com a prisão e a reabilitação de um desacreditado Robert Faurrisson. Seria improvável que Irving existisse se, antes dele, Faurrisson não tivesse emergido como o herói perseguido do revisionismo.

21 de Fevereiro - A ministra alemã e as brigadas de Londres acreditam que o extremismo na Europa se combate pela força da lei. Acreditam mal. A extrema-direita pode crescer no continente, sobretudo no Leste e, como se verá nas próximas presidenciais francesas, com o fenómeno Le Pen. Mas ela cresce por exclusiva culpa dos "partidos do centro": incapazes de reformar economicamente uma Europa estagnada e medrosa perante o "estrangeiro", os partidos instalados apenas contribuem para um mal-estar social que alimenta a besta do costume. E as bestas não quebram nozes. Quebram tudo.

Nova Aliança, 2 / 03 / 2007

Fiama e Luc-Férry

20 de Janeiro – Morreu a poetisa Fiama Hasse Pais Brandão ( 1938-2007 ). Lembremo-la no poema Urogalo:
O urogalo não cantou toda a manhã. / despida de sentimentos, procuro/os nomes e os mitos. / E a grande sombra/da árvore de palma veio pousar / sobre a relva nua e o decepado coto. / Não mais interiorizo a Natureza próxima. / Que o morto aloendro leve consigo / anos de infância e juventude, carícias / do vento, para sempre e em todo o lugar. //O urogalo viria em vez do melro, / cujo corpo sacode o restolho de velhas folhas, / cujo assobio se abafa na hera invasora. / Seria o sinal do último cantor da casa, / o desconhecido urogalo, que apagaria / esta tristeza de nada desejar, aqui e agora, / entre estes cepos, esta terra revolta / e os mortos tão absolutos e esquecidos, / depois de tão eternamente vivos.
in Cenas Vivas, Lisboa, Relógio d’Água, 2000.

26 de Janeiro - Esteve no Porto, a convite de Rui Rio, para participar na cerimónia do 5.º aniversário da chegada ao poder do autarca. Pertence à família socialista francesa. Chama-se Luc Férry e é filósofo.Falou da crise da democracia e apontou a globalização como responsável pelo esvaziamento do poder dos políticos. Defende novos valores centrados na família e considera Ségolène Royal e Nicolas Sarkozy os primeiros políticos e falar aos franceses, atribuindo-lhes uma revolução da vida privada. Alertou para a catástrofe que seria deixar a Turquia fora da UE. E o que disse o senhor? Coisas importantes. Façam o favor de tomar nota:

”A principal ameaça à democracia é ela própria. Hoje, as autoridades políticas não têm poder suficiente para fazer as mudanças, as pessoas não sabem, mas a verdade é que a globalização veio transformar muita coisa. Muitas das prerrogativas que pertenciam aos políticos são hoje exteriores à sua competência de políticos.” (…) (exemplos) “a Internet, os mercados financeiros, as deslocalizações. Tudo isso enfraquece o poder político a nível nacional. (…) A globalização não é um problema Norte/Sul, de os mais ricos ficarem mais ricos e os mais pobres mais pobres. O verdadeiro problema é que ela retira poder aos homens políticos de cada nação. Os mercados financeiros vieram retirar poder ao ministro da Economia português e ao francês também. A democracia prometeu-nos que iríamos fazer a nossa própria história, mas muito do que se decide é exterior à esfera nacional. (…) O que lhes confere algum poder (aos políticos) é a mediatização. Os ministérios transformaram-se em agências de publicidade que não agem, fazem comunicação. O essencial da guerra do poder político é ter uma boa imagem. (…) A verdade é que os políticos passam 99 % do tempo nos ministérios a bater-se pela imagem e só 1% a mudar a realidade. A mundialização retirou poder e a mediatização extrema transformou os ministérios em agências de publicidade. (…) (os políticos) são como as pessoas que vão tomar banho no mar. Vão entrando devagarinho. Se a água está fria, recuam e voltam a entrar. Começam a fazer reformas na saúde, na educação... Quando as manifestações começam, fazem um recuo. (…) Se compararmos o que se passa agora com a década de 30, na Europa, dizia-se que os políticos são uns mentirosos, não cumprem o que prometem, metem dinheiro ao bolso... (…) Quando aceitei o cargo não percebi o essencial: não estamos no cavalo para ir a algum lado. É uma espécie de rodeo. Estamos no cavalo para nos mantermos em cima dele. (…) (a solução) é a Europa poder reflectir sobre os valores. É preciso ser popular para ser eleito e impopular para governar. É como ir ao dentista. Ele é simpático, mas vai tirar-nos um dente a seguir. É preciso que as pessoas percebam que estamos a fazer coisas desagradáveis, mas estamos a fazê-las por elas. (…) Já ninguém dá a vida pela Pátria, por Deus e pela Revolução. Conhece alguém que dê a vida por estes valores hoje na Europa? Os grandes valores são aquelas que tocam aqueles que mais amamos, os valores da família. O sagrado continua a existir. Mas encarnou na humanidade, todos os movimentos humanitários e caritativos nasceram da história da família moderna, a que surgiu no século XVIII e conquistou o casamento por amor. No Antigo Regime, o casamento apenas seguia a necessidade económica de manter as terras ou a linhagem. A família moderna baseia-se no amor. (…) O político tem de explicar que faz as reformas, que aumenta o número de anos de serviço para que nós e os nossos filhos tenhamos reformas.

28 de Janeiro – A PSP da Madeira está a convocar à esquadra os professores que participaram numa manifestação contra o primeiro-ministro. De que lado estará o tão apregoado défice democrático?

30 de Janeiro – No Público: «Momentos bucólico-cómicos de um estado insano
Um homem de 34 anos foi detido domingo pela GNR de Idanha-a-Nova, Castelo Branco, acusado de caça ilegal, por utilizar toques de telemóvel como chamariz para caçar tordos, disse hoje fonte policial.»

31 de Janeiro – Leio num livro uma crítica a um pintor italiano: “uma elegância exagerada própria das culturas provincianas”. Não sei porquê, lembrei-me logo de Manoel de Oliveira.

Nova Aliança, 21 / 02 / 2007

7.2.07

O naufrágio da Nazaré, o mau exemplo português e a ETA

9 de Janeiro – Falemos desta vergonha portuguesa em que se traduz o naufrágio da Nazaré. À vista da praia, à vista da terra, um a um, os tripulantes do navio foram sendo engolidos pelo mar. O Ministério da Defesa mandou proceder a um inquérito que, certamente será arquivado. A verdade é que demorou hora e meia a chegar um helicóptero que poderia ter salvo aqueles homens. Quer queiram ou não, há uma versão de Portugal que nos envergonha. A TV do Estado, sempre fiel aos seus, no seu telejornal, demora a falar do caso. Começa com Saddam. Passa pela ETA. Antes de falar do naufrágio da Nazaré, resolveu falar de um naufrágio na Indonésia. E o naufrágio da Indonésia teve tanto tempo de antena como o naufrágio da Nazaré. E uma "reportagem" de bolo rei teve mais tempo do que a reportagem sobre os homens que morrem porque foram abandonados pelo seu Estado. Depois, uma reportagem sobre ginásios e dietas ocupou cerca de 5 minutos. É justo: despacharam a Nazaré num único minuto. Está certo, sim senhora. Quem morreu afinal? Meros pescadores, labregos sem importância. Ah, afinal ainda se vai falar outra vez de Saddam. Claro: culpar os americanos pelo mal do mundo é mais fácil do que culpar alguém dentro de portas.


10 de Janeiro - A Comissão Europeia (CE) está a utilizar o caso português como exemplo a não seguir no alerta que está a enviar aos futuros países-membros da União Europeia. O artigo é publicado pela Direcção-Geral de Economia e Finanças da Comissão Europeia, intitulado «Explosão e recessão em Portugal: lições para os novos membros do euro», no qual são sistematizados os erros cometidos pelo nosso País na fase imediatamente a seguir à entrada na união económica e europeia, em 1999.
Tomando por base estes erros, a CE retira cinco ensinamentos que devem ser seguidos pelos países que vierem a entrar na Zona Euro – em caso de forte crescimento da procura interna, seguir uma política orçamental restritiva; cuidado com os erros de sobreavaliação do crescimento do PIB nas fases altas do ciclo; aproveitar o maior dinamismo da procura interna para acelerar, e não adiar, reformas estruturais; manter controlado o crescimento dos salários; apertar a supervisão prudencial sobre os mercados financeiros.
11 de Janeiro – Em Espanha, por altura dos Reis, os pais contam aos filhos a seguinte história: A ETA faz maldades; Ninguém quer brincar com a ETA; Chega o menino Zapatero; A ETA é má porque nenhum menino quer brincar com ela; Zapatero começa a brincar com a ETA; A ETA promete não fazer mais maldades; A ETA diz que o menino Zapatero não quer brincar da maneira certa; A ETA está a ficar chateada porque o menino Zapatero não lhe dá os brinquedos; A ETA faz maldades. É para eles verem; O menino Zapatero também já não quer brincar com a ETA.


12 de Janeiro - A lei da pesca proíbe a pesca a menos de 100 metros de esgotos. Mas quais esgotos? A acreditar na propaganda socialista, não existem esgotos a ser lançados nos rios ou no mar. Ah, e também passa a ser proibido pescar a menos de 10 menos do pescador mais próximo. Imagina-se que esta lei vise proteger as espécies piscícolas do perigo que representam dois anzóis demasiado próximos. Ou então o legislador pretendia apenas impedir que dois pescadores passem uma tarde inteira a tentar pescar o mesmo peixe.

14 de Janeiro – O ministro da Saúde concluiu que não era necessário abrir qualquer tipo de inquérito a propósito do caso de Odemira. E defendeu a decisão num documento que incluía este argumento verdadeiramente extraordinário: mesmo que o homem tivesse demorado menos de seis horas a chegar ao hospital, o mais certo era que, em função dos traumatismos que sofreu, morresse de qualquer maneira. Esta é, no mínimo, uma visão arrojada: decide-se a competência de uma assistência médica pela autópsia do assistido. Não tenham dúvidas, deste modo a despesa pública vai descer consideravelmente. E quando sair do ministério tem já emprego assegurado num bom cangalheiro. Por favor, não sorriam, o assunto é sério…

16 de Janeiro – No momento em que escrevo a Av 25 de Abril está condicionada pela 16ª vez. Dizem-me que os 1ª, 4º, 8º e 12º buracos são da responsabilidade da empresa A, os 2º, 5º, 9º e 13º buracos foram da responsabilidade da empresa B, os 3º, 6º, 10º e 14º buracos foram da responsabilidade da empresa C. Finalmente os 7º, 10º, 11º , 15º e 16º foram feitos para confirmar as obras feitas pelas três empresas. Na Finlândia as coisas também se passarão assim?

24.1.07

As esperanças do novo ano, a vida privada e Carolina Salgado

1 de Janeiro – Que esperanças para o novo ano? Existe a visão dos bons e a dos maus.O terrorismo no Iraque desaparecerá e as tropas americanas retirarão em paz. Guantanamo fechará em menos de seis meses e os presos voltarão para os seus países. Os Taliban serão finalmente derrotados. Fidel Castro e Hugo Chavez reconhecerão a grandeza dos EUA. Bin Laden será finalmente capturado. Miguel Sousa Tavares escreverá um artigo sobre a felicidade que é ter a América de volta ao seio das nações civilizadas. O Congresso atribuirá direito de voto nas eleições americanas a todos os cidadãos do mundo. O planeta começará a arrefecer ( aliás, já se nota, hoje já está mais frio que ontem ). O McDonalds começará a servir alta cozinha francesa. O Irão desistirá de fazer uma bomba nuclear, pedirá a adesão à União Europeia e Portugal apadrinhará. Uma investigação do Congresso revelará novas provas sobre a conspiração para destruir o World Trade Center e iniciar guerras no estrangeiro. Bush será julgado por um tribunal internacional, que o condenará a prestar serviço cívico por crimes contra a humanidade. Grandes esperanças para 2007. Grandes esperanças...


3 de Janeiro - Os cidadãos sentem que a sua vida privada está ameaçada, que todos os dias podem ser abusados, observados, escutados, controlados, frustrados, ameaçados; sentem que a todo o momento alguém lhes pode entrar pela casa dentro e devassar a sua vida privada até ao mais ínfimo detalhe, e têm a certeza que essa pessoa será alguém que o faz a título oficial e na qualidade de funcionário do Estado.

Um homem decide lançar um negócio de restauração. Fez o investimento, arrendou um espaço e contratou os empregados. Mas ele não pode começar o negócio antes que lhe sejam feitas uma multiplicidade de inspecções e concedidas licenças e alvarás. Tudo demora uma eternidade. Passou mais de um ano, as licenças não estão todas concedidas e faltam ainda os documentos de algumas inspecções. Ele continua a pagar a renda do espaço, os salários dos empregados, os painéis publicitários. Com o desespero próprio de quem está perto da ruína, decide abrir o restaurante ao público. Mas ele não vai conseguir dormir porque sabe que a todo o momento lhe podem fechar o restaurante, mover-lhe um processo administrativo ou mesmo criminal e o seu nome aparecer nos jornais. Será a ruína financeira e pessoal.

Uma pessoa compra uma casa antiga para a mandar restaurar e vir a habitá-la. Porém, não pode iniciar as obras, sem que uma multiplicidade de autoridades administrativas, desde a câmara municipal ao serviço de abastecimento de águas, lhe aprovem uma multiplicidade de projectos e lhe concedam uma multiplicidade de licenças. O tempo vai passar e ela vai dar-se conta que, quem manda na casa e quem vai decidir qual o tipo de caixilhos, de portas e de janelas e se a casa poderá ou não ter um jardim, não é ela, mas uma massa anónima de burocratas, engenheiros, políticos, arquitectos que trabalham na câmara e numa grande multiplicidade de outros serviços administrativos.

A administração fiscal decide que um contribuinte tem de pagar um imposto que ele, de facto, já pagou. O cidadão protesta, faz requerimentos e mais requerimentos para que o erro seja reconhecido e corrigido, sem obter resposta. O Fisco persiste no erro e ameaça-o que, senão pagar até ao dia tal, ser-lhe-ão penhorados o vencimento e as contas bancárias. O cidadão acaba por se render, e paga outra vez aquilo que já pagou, ainda por cima com juros e com coimas. O simplex afinal complica. E, não obstante, passados quinze dias, o seu patrão e o seu banco recebem ordens da administração fiscal para lhe penhorarem o vencimento e a conta bancária. Quantos requerimentos, quantos meses vão ser necessários para levantar as penhoras? E os danos que o contribuinte sofreu e a vergonha por que passou? E quem, na administração fiscal, responde por este abuso? A resposta é evidente: ninguém.


6 de Janeiro - Os que falam dela na rádio, nos jornais ou na televisão não conseguem pronunciar sequer o seu nome. Afinal a mulher era uma alternadeira. Como o mercado é flutuante, o emprego é precário. Os locais de trabalho são bares e clubes, alimentados por homens que precisam de divertimento. Trabalham muito, fazem andar a roda das nossas existências e precisam de divertimento. Sempre foi assim. É chamada a mais velha profissão do mundo. E sempre houve poderosos que se apaixonaram por elas, porque tão antigo como elas é o amor e a necessidade de amor dos homens, mesmo quando são poderosos e usam as mulheres como bens de consumo descartáveis. De vez em quando, uma mulher sai do bordel para a corte. Alguns poderosos não gostam. Acham mal. É o início da desordem, o princípio da catástrofe. As coisas não devem ser mudadas de lugar. O bordel não deve ser confundido com o sítio das outras mulheres, as donas compassivas, as nossas mulheres, que as visitam nos lares de abrigo, lhes ensinam a virtude, o bom caminho e se for preciso lhes dão ajuda de berço. Esta mulher chama-se Carolina Salgado. Viveu com os poderosos, conhece-os, aprendeu-lhes as manhas, joga o jogo deles. Há quem não queira ouvir a história. Percebe-se.

8.1.07

As crianças nos hotéis, Carolina e os portáteis nas escolas

13 de Dezembro - Segundo os jornais, já deram entrada nos tribunais do Porto e de Gaia pelo menos seis processos contra Carolina Salgado, por difamação. A confirmar-se tal informação, o Ministro da Justiça estará já a considerar convidar Carolina para ser ouvida a par das 15 maiores utilizadores empresariais que entopem a justiça portuguesa. O objectivo é aliviar os tribunais das inúmeras cobranças de dívidas relacionadas com empresas.
16 de Dezembro - Há silêncios diferentes uns dos outros: os que calam por conveniência e os que calam por desinteresse. No primeiro, e para não sair de Portugal, os que perguntavam pelo MIT; os que explicavam o génio de destruir Arafat e inventar a democracia pelas armas no Médio Oriente; os que gritavam contra Israel e o ocidente mas não se interessam pela nova guerra civil no Líbano apesar (até por causa) da «força» da ONU; os que falam em censura na RTP mas não clamam pela intervenção de quem de direito; os que percebiam imenso de futebol em Agosto e Setembro; os que não perdem tempo a saudar a «crítica» anónima ordinária até perceberem que não estão a gabar quem pensam; etc., etc. Precisam tanto do silêncio para continuar sempre na mesma, sempre a escrever mais depressa do que pensam, que até apagam as referências aos outros. Os outros escreveram a tempo. E não precisam de se repetir. Moral da história: quem precisa, cala-se, de preferência fazendo muito ruído para entreter e continuar. Quem não precisa, cala, por saber que em Portugal ter razão antes do tempo é o menos; não se pode é querer saber da razão, isso é insuportável para os que dispõem sempre da razão no tempo certo, o deles.
18 de Dezembro - Segundo uma reportagem na SIC Notícias de ontem, parece que há uma espécie de hotéis e de restaurantes em Portugal que “desaconselham” o uso de crianças pela clientela. Felizmente, para eles, não “desaconselham” o uso de “pretos”, de “chinocas”, de “gays”, de “lésbicas”, de “anormais”, de “pobres” por serem “pobres”, ou de canídeos. É que se assim fosse, certamente já lá teriam há muito tempo à porta, literalmente, toda a indignação do “politicamente correcto” português, desde as mais variadas organizações “libertárias” e contra as “injustiças”, representativas daquilo que mais "puro" há na sociedade civil, até ao Governo e à generalidade dos partidos políticos - do CDS ao BE, passando pelo PSD e pelo PS. Mas como se tratam de crianças que, provavelmente, nem sequer são mal tratadas pelos paizinhos, não há lei, não há Constituição. Isto é... a Constituição que se lixe! E já agora tenhamos esperança de que não se ande por aí a "desaconselhar" a entrada a "velhos" e "velhas" em estabelecimentos afins.
20 de Dezembro - Segundo variadíssimas cabeças com provas dadas, parece que não se pode acreditar em Carolina Salgado. E não se pode porquê? Porque a Carolina está ressabiada. Ora, convém colocar algum travão na hipocrisia. A senhora decidiu escrever um livro, procedimento ainda pouco habitual em Portugal, mas vulgar em Inglaterra ou nos Estados Unidos. Se tivesse soprado as informações aos jornalistas a coberto do anonimato não haveria qualquer escândalo. Felizmente, resolveu dar a cara. A senhora Carolina Salgado pode ser a mais miserável e mesquinha das personagens, mas o que está aqui em causa e deve ser averiguado é o que ela diz, e não as razões que a levaram a dizer.
22 de Dezembro – Lembram-se dos PC’s portáteis adquiridos pelo ministério da educação? Alguns terão sido atribuídos de forma errada. Na sequência deste processo, o ME, tentando reparar o erro, mandou um ofício e uma guia de transporte (via fax), solicitando às escolas, que não tinham recebido portáteis, que os fossem buscar às outras escolas.Como provavelmente, nenhuma escola (ou nenhum professor responsável pela escola) resolveu fazer essas viagens, o ministério encontrou uma solução que não é de todo imaginativa nem será inédita, “desbloqueando uma verba para se comprar mais portáteis” para as escolas que não receberam a encomenda inicial. Ninguém me convence que isto não faz parte de um plano bem gizado para, à revelia de critérios economicistas, aumentar o parque computacional das escolas públicas e contribuir para aumentar os efeitos do plano tecnológico.
24 de Dezembro – A Polícia britânica interrogou o primeiro-ministro Tony Blair, durante cerca de duas horas, no âmbito das investigações em curso sobre as suspeitas dum negócio de títulos nobiliárquicos. É a primeira vez que no Reino Unido um primeiro-ministro, ainda para mais em exercício, é chamado a “ajudar a Scotland Yard” em investigações criminais. O caso foi levado à Justiça depois de levantadas suspeitas a indícios de alguns financeiros e industriais terem apoiado o partido que suporta o Governo, aceitando “emprestar” avultadas somas solicitadas para dispendiosas campanhas, para serem posteriormente agraciados com títulos nobiliárquicos que, por proposta do Governo, a Monarquia lhes concedia. Sem desmerecer a pinderiquice nacional, e mal comparado, este caso seria o mesmo se a Polícia Judiciária se pusesse agora a investigar o que poderia estar por detrás dos quilos de condecorações que Sampaio distribuiu quando esteve em Belém, dando comendas e oficialatos a torto e a direito, já que cavaleiros, condes e barões não podia armar.