30.9.07

Dalai Lama, Chinatown e Maddie

9 de Setembro - Leio no "Público" de hoje que o ministro Luís Amado, declarou que "oficialmente, o Dalai Lama não é recebido por responsáveis do Governo português, como é óbvio". E instado a explicar porquê, explicou-se: "pelas razões que são conhecidas".
Antecipava, por certo, o desprazer que um encontro oficial em Portugal e com algum membro do Governo que está na Presidência da UE não deixaria de causar ao regime de Beijing - tremeriam os negócios da China que a diplomacia portuguesa estará diligentemente, pacientemente, a tecer.
O ministro estava a ser consequente com o que tem sido o tipo de diplomacia em que vai especializando Portugal: nada de incomodar mandarins com conversas parvas sobre direitos humanos; importa é adulá-los e acenar-lhes até com o levantamento do embargo de armas decretado pela UE à conta desse episódio "pré-histórico" do massacre de Tianamen.
Mas como Luís Amado deve ter apurado o paradigma de "nunca correr o risco de desagradar a ricos e poderosos" que vem exercitando, seja a propósito do Iraque, de Guantánamo, da Rússia ou de África, e sendo o Dalai Lama figura cada dia mais bem recebida em Washington (onde acaba de receber a Medalha de Ouro do Congresso), é de esperar que o ministro se empenhe numa saída tão equilibrada, como equilibrista: proporcionando encontros "não oficiais” com altos dignatários portugueses com o Dalai Lama - que até oferece essa conveniente cobertura de ser "líder religioso".
E não consta que do PM belga ao austríaco, do norueguês ao australiano, algum tenha sido comido por Pequim ao pequeno-almoço; pelo contrário, qualquer dos seus países tem (porque soube construir) muito mais visíveis e rentáveis relações económicas com a China do que Portugal... e sem a “desculpa” de Macau…
O esforço não exige nada de especial a oministro: basta esgravatar no saco da velha "esperteza saloia".

15 de Setembro - O Expresso noticia que Maria José Nogueira Pinto, de novo à frente do projecto de reabilitação da Baixa-Chiado, agora pela mão do PS, quer acabar com as lojas chinesas na Baixa de Lisboa. Esta «ideia» pouco fica a dever à «ideia» das amêijoas e das corvinas de Sá Fernandes. Para além de poder ser interpretada como xenófoba (os partidários de Sá Fernandes já escreveram: «a Câmara ter uma “comissária” para a Baixa-Chiado, que já pela segunda vez dá provas da mais bafienta xenófobia é, no mínimo, desprestigiante para uma cidade que se quer moderna, cosmopolita e desenvolvida»), a «ideia» só é concretizável, a curto prazo, violando as mais elementares regras de mercado e violando a Constituição. Ou seja, impedindo (ilegalizando) a compra, o arrendamento ou o trespasse na Baixa a um determinado tipo de comerciantes, em função da nacionalidade (chineses) ou do objecto do comércio (produtos chineses). É óbvio que se trata de uma tonteria. A Baixa lisboeta está degradada, a todos os níveis, e é apenas um ponto de passagem. A restauração definha em qualidade e até a Loja das Meias sucumbiu por falta de clientes, por exemplo. As boas marcas e o comércio de qualidade não querem a Baixa e, por isso, a compra, o arrendamento e os trespasses são baixos em relação a outras zonas da cidade. Só a requalificação daquele território, em função dos desejos, dos hábitos e das necessidades das pessoas (e não em função de «projectos» saídos da cabeça de «iluminados»), que dê nova vida à Baixa, irá permitir a valorização dos espaços físicos, da procura e do comércio, e então, haverá uma selecção da oferta e da qualidade. Um dos males do nosso «planeamento» passa, em primeiro lugar, pela noção de que nunca se executará; em segundo lugar, pela (ir)responsabilidade dos «responsáveis» em função dos resultados. Assim, podemos brincar à vontade às cidades, ao planeamento, etc. O último a sair que apague a luz.

16 de Setembro - Quando eu pensava que seria impossível descer mais baixo do que os "debates" da SIC, eis que a RTP nos oferece um Prós e Contras sobre o caso McCann. Um Prós e Contras, como o nome indica, requer alguém que esteja por qualquer coisa e alguém que esteja contra qualquer coisa. Ora, pergunto eu, os "especialistas" na matéria (que hoje são mais ou menos dez milhões de portugueses) vão estar por e contra o quê?
Haverá um representante dos asssassinos e raptores de criancinhas? E outro das próprias criancinhas? E os cães, senhores, os cães? E o turismo do ALLGARVE, please don`t forget. Deve ser a isto que chamam serviço público.
Pensando melhor, a minha pergunta até é um pouco estúpida. Todos sabemos que os especialistas e os dez milhões vão estar por ou contra, não de quê, mas de quem. E todos sabemos por quem é que ninguém vai estar.
Em vez de debate, podiam chamar-lhe abate. Também é serviço público.

Nova Aliança, 20 / Setembro / 2007