9.10.08

Os assaltos, Cristiano Ronaldo e as massagens

7 de Setembro - Se um ingénuo forasteiro aterrasse em Portugal há um mês e assistisse a alguns dos noticiários nacionais, por certo assustar-se-ia com o país, aparentemente sem lei e a saque, um hollywoodesco faroeste europeu. Até um jornal diário como o Correio da Manhã teve necessidade de criar um infograma diário com o seguinte título: “Assaltos das últimas 24 horas”.
Doutro modo se  o ingénuo turista desembarcasse na última semana e atendesse a alguns dos recentes  telejornais, verificaria confortado as inúmeras reportagens de rusgas e intervenções policiais, perseguições e musculadas detenções ao vivo, qual reality show, um triunfante espectáculo do país a ser posto por ordem ali mesmo em directo.

Pensará, agora sim, este é um país seguro. E tem razão, senão vejamos: as placas identificativas dos estabelecimentos comerciais devem ser presas na parede por “parafusos de aço inox em cada canto, com 8mm de diâmetro e 90mm de comprimento”, determina uma portaria rectificativa do Centro Jurídico da Presidência do Conselho de Ministros. Os anteriores parafusos mediam apenas 60mm e havia que manter a segurança das placas, prevenir a sua queda e as suas nefastas consequências sobre comerciantes e clientes.

8 de Setembro – Felizmente, ainda há notícias assim ( aspas do Correio da Manhã ): Giovanna tem uma hepatite incurável. Em Julho foi-lhe induzido o estado de coma para evitar as dores. Mas, antes, Giovanna pediu que a despertassem do coma para poder casar com o companheiro e pai do seu filho.

Aconteceu no passado domingo, em Pádua. O noivo, as testemunhas e o celebrante tiveram de usar máscaras e vestes esterilizadas e a cerimónia realizou-se em plena unidade de Cuidados Intensivos. A noiva estava em sofrimento físico mas feliz. Caiu em coma logo após o ‘sim’. Apesar de não dever recuperar mais a consciência, o seu marido garantiu que a sua vida terminará “num raio de alegria, uma felicidade que nada lhe roubará”.

9 de Setembro – No jornal “Sol” deparamo-nos com um Homem: «Ramalho Eanes prescindiu dos retroactivos a que tinha direito relativos à reforma como general, que nunca recebeu. O Governo diz ter sondado o ex-Presidente, que não aceitou auferir essa quantia (a qual ascenderia a mais de um milhão de euros). A reforma só começou a ser paga em Julho, mas sem qualquer indemnização relativa ao passado.»

10 de Setembro - Cristiano Ronaldo quis ir à Madeira, sua terra natal, para receber uma "bota de ouro". Parece que tencionava homenagear, a título póstumo, o pai. No aeroporto, ignorou os compatriotas que o foram saudar à chegada. Em Viseu, durante o estágio da selecção, já tinha feito o mesmo. Ontem, à porta do hotel onde foi coroado como tal, o "bota de ouro" fez esperar em vão umas dezenas de madeirenses orgulhosos por o pé que calça a "bota" ser um dos seus. Ilusão deles. Mais uma vez, Ronaldo só estava disponível para o que o esperava lá dentro: o sr. Horácio Roque – financiador da operação - e as televisões.

Babaram-se uns para os outros porque, naturalmente, estão muito bem uns para os outros. Ex-pobre, imaturo e ignorante, o "bota de ouro" não passa de um deslumbrado com talento nas pernas. Nas três pernas, a avaliar pelo galinheiro que cacareja permanentemente atrás dele nas revistas ditas “sociais”. De resto, o dinheiro encarregou-se de destruir o menino que jogava na rua inclinada com os vizinhos cuja alegria se quis manifestar junto dele e que ele, moldado pelo espectáculo em que se tornou, se recusou a partilhar. O "bota de ouro" é o expoente de uma certa alarvidade "social". Uma alarvidade que brilha tanto ou mais do que o ouro da bota. E que costuma acabar tão surpreendentemente como começa.

15 de Setembro – Esta foi uma das tiradas de Verão: "Toda a gente sabe como começa uma massagem, nunca se sabe é sabe como acaba".
Caramba!, isto não dava uma proibição, dava era um magnífico slogan publicitário:
 
 
"AllGarve. Because every one knows where a massage starts, no one knows how it ends...".

Nova Aliança, 18 / Setembro / 2008

Palin, a ERC e o Magalhães

6 de Setembro - Esta coisa da Sarah Palin ter contratado uns amigos para uns cargos lá no Alasca é um problema para o qual nós portugueses somos muito sensíveis e exigentes. Não o admitimos lá, num país e num Estado que não é o nosso, e muito menos o admitiríamos – estou certo - aqui ( onde, graças ao nosso espírito crítico, estes problemas não existem ). Político que o fizesse cá teria a sua carreira terminada no dia seguinte. O que é notável nos portugueses não é apenas o seu sentido ético. O que é notável é o seu sentido ético universal, independente dos interesses próprios, do local ou da cultura. A preocupação desinteressada por questões éticas no governo do Alasca é comovente.

8 de Setembro - Normalmente as coisas passam-se assim: ou é a vida que imita a arte ou é a arte que imita a vida e não há que tomar partido. Ambas as situações são boas. A diferença está no preço. Não vale a pena discuti-lo porque o mercado da vida e o da arte encarregam-se de o regulamentar. Por exemplo, vacas.
O artista Damien Hirst enfiou uma vaca inteira numa barrica transparente cheia de formol e vendeu-a por 11,5 milhões de euros a um coleccionador de Londres. É o preço da vaca artística.
Em Idanha-a-Nova desconhecidos roubaram uma vaca de uma quintarola e o proprietário do animal afirmou-se lesado em 13 mil euros. É o preço da vaca não-artística. Há aqui uma disparidade. É o preço do formol, certamente.

10 de Setembro - Apesar de intimada pela Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), em Janeiro, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) só agora permitiu que o Expresso consultasse o "processo Sócrates", de quase 300 páginas.
Inicialmente, a ERC recusou a sua consulta, tendo o semanário protestado junto da CADA. Uma edição recente do jornal revelava pormenores sobre as audições, que tiveram como objectivo avaliar a existência de pressões sobre os jornalistas no caso do diploma de Sócrates.
A ERC concluiu ser normal que existam pressões nas relações entre jornalistas e políticos. Esta conclusão é aventada no acórdão que se reporta às diligências efectuadas pelo Governo e pelo próprio primeiro-ministro, José Sócrates, para que fossem travadas as notícias sobre a sua licenciatura na Universidade Independente.
Assumindo "um certo grau de tensão", a ERC refere que ela é compreensível, "dada a cultura profissional dos primeiros e pelo choque que resulta do facto de ambas as partes agirem com interesses divergentes". Por outro lado, a ERC entende que Sócrates, ao tentar travar na imprensa as notícias sobre a sua licenciatura, não efectuou qualquer pressão, antes fez démarches. ( Repararam na subtileza???? )
A ERC concluiu que os telefonemas efectuados para o jornalista do PÚBLICO que investigava o caso, Ricardo Dias Felner, e para o director do jornal, José Manuel Fernandes, apesar de terem sido feitos pelo próprio Sócrates, não reuniam "elementos factuais que comprovem ter existido o objectivo de impedir, em concreto, a investigação".
Tanto Ricardo Dias Felner como José Manuel Fernandes, nos depoimentos que fizeram na ERC, disseram que o modo como foram abordados pelo primeiro-ministro resultou numa "tentativa de pressão ilegítima". O director do PÚBLICO foi ainda mais longe, reportando-se à conversa com Sócrates, no decurso da qual o primeiro-ministro teria dito: "Fiquei com uma boa relação com o seu accionista [Paulo Azevedo] e vamos ver se isto não se altera." Qualquer semelhança entre esta declaração e uma forma de pressão é certamente mera coincidência.

14 de Setembro - O "Magalhães" vai dar pano para mangas. Já vamos na segunda leva. Primeiro, houve aquele anúncio de um "produto nacional" que, afinal, de "nacional" tem apenas um terço. Depois - aconteceu hoje - o governo deslocou-se em bando a escolas, cheio do "Magalhães" e de "controlo parental". Este neologismo quer dizer que é suposto os paizinhos atentarem naquilo a que os meninos têm acesso através do bicho. A SIC experimentou três e foi parar a sítios de "gatas maravilhosas". O "Magalhães", por consequência, promete não apenas "info-ligados" (um belo termo da lavra do 1º ministro) mas igualmente "adiantados sexuais". Finalmente, o "Magalhães" terá o seu apogeu quando, dentro de dias, Chávez vier cá comprá-lo, com ou sem as "gatas maravilhosas". Grande "Magalhães".