27.11.08

A Gebalis e a Justiça Inglesa

2 de Novembro - É preciso colocar em letras garrafais o nome dos senhores ex - administradores da Gebalis, em Lisboa, não vá dar-se o caso de os "reciclarem" um dia destes. Francisco Ribeiro, Mário Peças e Clara Costa usaram dinheiro público para propósitos que nada tinham a ver com o propósito da Gebalis. «O prejuízo causado totaliza 200 mil euros, gastos em viagens, refeições (no Gambrinus, Bica do Sapato, Porto de Santa Maria, etc.) e artigos de luxo. Sublinhar que 200 mil euros corresponde a 40% do subsídio anual atribuído pela Câmara de Lisboa à Gebalis. Um dos arguidos comprou duas canetas Mont Blanc, uma no valor de 1700 euros, outra no valor de 990. A única mulher do trio fez quinze viagens ao estrangeiro, num período de 20 meses, gastando nelas 34 mil euros (2267 euros por viagem). O senhor das canetas só fez três, nas quais gastou 6600 euros (2200 cada). O outro fez quatro, tendo gasto 1900 euros nos passeios, o que não deixa de ser um extraordinário exemplo de contenção de despesas.» Há gente presa, ameaçada de prisão ou com "medidas de coacção" por um mil avos disto. Ora isto é "pretralhismo" à portuguesa. No caso doméstico, é a fusão de um português com um "metralha", "dos Irmãos Metralha, sempre de olho na caixa forte do Tio Patinhas", o cofre público. Se vasculharem com método, verão que o que não deve faltar por cá é destes. Os de olho, mão e o resto na caixa forte.

6 de Novembro - Um camionista português foi acusado da morte de seis pessoas e vai ser presente a tribunal em breve. Paulo Jorge Nogueira da Silva é suspeito de condução perigosa num acidente ocorrido na terça-feira, na auto-estrada M6, em Inglaterra.
Segundo noticia a Sky News, Paulo Silva, de 46 anos, vai ser julgado pela morte de uma família de seis pessoas. Oriundos de Llandudno, no País de Gales, morreram carbonizados quando a viatura em que seguiam ficou, alegadamente, debaixo do camião conduzido pelo português.
Entre os mortos, todos da mesma família, encontrava-se uma bebé de 10 semanas, Ellouise Statham, que perdeu a vida, juntamente com os pais, David e Michele. faleceram, ainda, os outros três filhos do casal, Mason, 20 meses, Reece, 13 anos, e Jay, 9 anos.
Isto aconteceu na Inglaterra, cujo sistema judiciário é totalmente diferente do nosso, quanto ao modelo seguido. Nem os juízes, lá, são escolhidos como cá. Nem os procuradores são figuras comparáveis, às de cá. Nem, principalmente, as leis processuais, são idênticas às de cá.
Na Inglaterra, com séculos de democracia e atenção aos direitos individuais, uma pessoa como este português que interveio directamente num acidente de viação, tem este destino:
Depois do gravíssimo acidente ocorrido na terça-feira, portanto há dois dias, a polícia deteve-o e levou-o para a esquadra nessa condição. Provavelmente, teve direito a advogado, intérprete, defesa circunstanciada. Passados dois dias, é formalmente acusado de homicídio e segundo o jornal, já será julgado pela morte de seis pessoas.
Deve descontar-se, ao jornal, a notícia sobre o "julgamento". Estes jornalistas julgam-se dispensados do rigor dos termos informativos e muito mais do rigor conceptual que leva a explicar a quem não entende, o significado de expressões e assuntos que exijam algum conhecimento técnico.
Assim, um julgamento, não equivale a um interrogatório para aplicação de medida de coacção. E que pode ser a prisão preventiva, remível, neste caso, à famosa caução que só pode ter a natureza de carcerária, ou seja, para substituir a prisão.
E como acontece em Portugal?
Tomemos o caso paradigmático do acidente ocorrido há uns meses numa estrada rápida do Nordeste transmontano e que vitimou vários idosos, que seguiam num autocarro, abalroado por um veículo ligeiro.
Na altura, apareceu no local toda o circo mediático costumeiro, para tentar dar a explicação do sucedido. A única pessoa interveniente e sobre quem surgiram suspeitas de comportamento inadequado na condução ( confirmado indiciariamente meses depois), ficou em liberdade e nem sequer foi ouvida em declarações na altura. Muito menos detida ou com prognóstico nesse sentido.
O que a polícia de estrada ( GNR-BT) nesse caso, faz, é o trivial: tomar conta do caso, participar ao Ministério Público, e depois, investigar. A audição das testemunhas e suspeitos, com recolha de provas fica por conta da polícia, também. Ao fim de alguns meses, por vezes longos, elaboram um relatório onde dão conta do resultado da investigação. Nesta altura, esses relatórios são tecnicamente bem elaborados, com indicações concretas das causas possíveis do acidente e dos responsáveis.
Só depois disso, o MP, elabora o despacho final no processo com vista ao destino que pode ser a acusação penal.
E depois dessa acusação, decorre um prazo de algumas semanas, para uma eventual instrução a cargo de um juiz e para reapreciar os fundamentos da acusação, se for esse o caso.
Só então, passados mais uns meses ou semanas, o processo chega à barra do tribunal propriamente dito. Com o julgamento a demorar o que tiver que demorar ( alguns, pelos vistos, demora anos!).
Tudo isto em resultado das leis que temos e nada mais. E em boa parte dos casos, para inglês ver.
Mesmo dando o devido desconto, pelo julgamento aqui anunciado, a verdade é que a formulação de um "indictment", de uma acusação formalizada no sentido de a polícia ter recolhido provas do facto criminoso, suficientes para apresentar o suspeito ao juiz, em dois dias, é motivo de reflexão sobre os nossos métodos. Que não sobre o modelo...



Nova Aliança, 13 / Novembro / 2008

7.11.08

A ERC, o equilíbrio na televisão e a "literatura" de José Rodrigues dos Santos

4 de Outubro - Leio no Expresso online: “No relatório intercalar de avaliação do pluralismo político-partidário divulgado esta semana, a ERC diz que a RTP deve "promover uma representação mais plural de forças e sensibilidades político-partidárias". (...) A direcção da RTP já decidira diminuir, depois de sucessivas insistências da ERC, o tempo de antena de Marcelo para o equilibrar com o do socialista António Vitorino. Segundo o Expresso apurou, em preparação estará uma nova grelha de comentário político que deverá dar espaço aos outros partidos durante o ano eleitoral que aí vem. O professor, cujo comentário dominical na televisão pública foi reduzido no regresso de férias em 15 minutos - passou dos 35 habituais para 20 minutos, para ficar mais equilibrado com os 15/20 que Vitorino ocupa à segunda-feira -, acha bizarro associarem-no a uma mera voz do PSD”.
Ora bem: depois de mais este momento ASAE da ERC (Entidade Reguladora da Comunicação), sugiro que a RTP tome medidas profundas no sentido da poupança dos custos com pessoal. É que começam a não fazer falta na casa directores de informação, editores, chefes de redacção. Basta um elemento designado pela ERC, munido de um cronómetro, e o jornalismo da estação pública tornar-se-á impoluto, isento e livre. Com tempos marcados para cada partido, cada instituição, talvez mesmo uma distribuição equitativa e justa do tempo dedicado ao crime em função da sua representatividade no espectro nacional...
Bizarra não é a peregrina ideia de ver Marcelo como um “representante” do PSD – para mim, o seu valor acrescentado é a capacidade de expressão, a inteligência, a cultura e o raciocínio que exibe semanalmente -, bizarra mesmo é a existência da ERC...

PS - A subversão de todos os valores que identificam e marcam o jornalismo – trabalho editorial, escolha, hierarquia da informação -, é levado ao extremo por esta Entidade, que quer transformar os espaços jornalísticos da RTP numa versão pós-moderna dos Tempos de Antena. Triste sina, a do jornalismo televisivo nos dias que correm: voltar àquelas longas e penosas horas de emissão a preto e branco, nos idos de 70, com espaço e tempo marcado para partidos, movimentos, associações, grupos jantaristas, escuteiros, produtores de leite, eu sei lá...
8 de Outubro - Manuel Sebastião (aquele que comprou uma casa ao ministro Manuel Pinho, ao que dizem, sem contrato promessa nem escritura), elucidou hoje, no Parlamento que demora cerca de um mês para que os preços dos combustíveis reflictam as oscilações do preço do barril do petróleo.
O amigo de Pinho deve ter feito a média: é que quando se trata de subir o preço demora muito menos - mas quando já é para descer o período de tempo parece-me ser bem maior…
10 de Outubro - «Os meus romances são muito meus. Não conheço nenhum autor que escreva os romances como eu os escrevo. (...) Sinto-me à vontade com qualquer género, o que importa é que eu e o leitor tenhamos prazer.(...) Construo o livro na minha cabeça e o problema é os meus dedos serem suficientemente rápidos para acompanhar as ideias que fluem da minha mente.» Não, não é Hugo, Flaubert, Dostoievsky, Roth, Clezio, Coetzee ou mesmo Rosa Lobato Faria. É apenas Rodrigues dos Santos em delirante auto-retrato. A avaliar por esta fantástica "percepção" de si mesmo - do seu "prazer", da sua "cabeça" e dos seus "dedos" - JRS ainda um dia fará literatura a partir do leite derramado nos calhamaços que deposita periodicamente nos supermercados. Por enquanto não.


Nova Aliança, 30 / 12 / 2008

O património de Lisboa e o ensino do português

29 de Setembro - "Estou de plena consciência. Aluguei um andar, legal, com valores legais", disse a sra. D. Ana Sara Brito, ao lado de Costa, o presidente da CML de quem é vereadora. Acrescentou que se tratava de "uma casa atribuída legalmente e de acordo com critérios à época e a situação à época." Talvez a criatura quisesse dizer que "estava de consciência tranquila" e saiu-lhe a "plena consciência" que, afinal, com a explicação posterior dos "critérios", acaba por ser freudianamente mais adequada. Pelo meio mencionou a inevitável "ética" e a "confiança" de Costa. Está certo. Trinta anos de maus hábitos não se mudam de um dia para o outro. Mesmo que lhe chamem "património disponível". Só o nome da coisa é todo um programa.

30 de Setembro - Em poucos dias - não é "notícia" porque estraga o falso "glamour" em que o regime vive - suicidou-se uma meia dúzia de agentes policiais, ora da GNR, ora da PSP. Desde quase adolescentes (vinte e pouco anos) até homens mais maduros, esta gente que supostamente vela pela nossa existência, decidiu colocar um termo à deles porquê? A presença constante de uma arma é tentadora? A vida "privada" e a de agente da autoridade cruzaram-se em algum nó górdio irreversível? Sem provavelmente terem lido muita filosofia, estes homens, no acto limite do suicídio, descobriram aquele que alguns consideram o único "tema" verdadeiramente filosófico. E levaram, para a eternidade, esse segredo. Falo disto porque eram pessoas com uma função especial que, diz-se, o regime tem o dever de acarinhar para que eles cumpram o dever de nos proteger. Afinal, nem eles conseguiram proteger-se de si próprios. Dá para pensar.

1 de Outubro - O SEF/Porto deteve cinco estrangeiros suspeitos dos crimes de usurpação de identidade e de uso de documento alheio, por se encontrarem a fazer exames de língua portuguesa em lugar de outros, revelou fonte escolar.
Cinco homens, dois paquistaneses, um marroquino, um são-tomense e um guineense, foram detidos nas escolas Almeida Garrett de Gaia e Carolina Michaelis do Porto quando tentavam fazer o exame de língua portuguesa, em vez de outros imigrantes (do Gana, do Paquistão, da Índia e de Marrocos) - e com identidade falsa. (...) As autoridades suspeitam de que o actual sistema de exames tem proporcionado um grande número de fraudes a nível nacional, com imigrantes com alguns anos de permanência em Portugal, a substituírem outros que pouco ou nada falam e escrevem português." Lusa
A nova Lei da Nacionalidade exige que um imigrante que solicite a nacionalidade portuguesa, tenha, entre outros requisitos, um conhecimento mínimo da língua falada e escrita, o que implica a realização dos respectivos exames.

Espero que a diligente Directora Regional de Educação do Norte não passe mais esta informação à Ministra da Educação. Com a vontade que a Ministra tem de alcançar a marca de 100% de sucesso escolar, este método pode mesmo vir a fazer "escola".

2 de Outubro - Na inimitável "Quadratura do Círculo" o dr. Costa, presidente da CML e ilustre dirigente do PS absolutista, acusou a blogosfera de ser um "submundo" que manifestamente o repugna. Bastou olhar para a cara dele quando começou a falar da coisa para perceber que, se pudesse, vontade não lhe faltava para suprimir o referido "submundo". Pacheco Pereira "salvou" um por cento da blogosfera desse "submundo" e adiantou que esse um por cento valia por muitas das coisas que se publicam e exibem na tranquila "superfície" desejada por Costa. Concordo com isto e também abomino o anonimato. Tal como acho que noventa e nove por cento do que se escreve nos jornais, se ouve na rádio e se vê na televisão é "submundo". Todos os dias , aliás, me deparo com a dificuldade em descobrir na percentagem que resta algo que me ilumine, esclareça e não me meta nojo. Aliás, mais valia ao dr. Costa ter estado calado. Será que ele ainda não reparou que até uma respeitável instituição como a CML possui um anónimo "submundo" que o presidente não domina, não conhece e manifestamente receia?
3 de Outubro - Uma mulher de 90 anos que vive há duas décadas num contentor em Viana do Castelo vai finalmente ter direito a «casa a sério», graças à construção de uma passagem inferior à linha de caminho-de-ferro. Esta senhora não teve a "sorte" de viver em Lisboa. Provavelmente a Câmara de Viana do Castelo não tem "património disponível", como a CML, e a senhora não tem amigos que lhe "metessem cunhas" para, em vinte anos, arranjar uma casa. Quem, dos bafejados pelo "património disponível" da CML, estaria pronto a aguentar a vida num contentor?

Nova Aliança, 16 /10 / 2008