9.10.07

A nova Chinatown, o quadro desaparecido e a ambulância de tipo A-1

18 de Setembro - A acreditar na mitologia de alguns, a América é um vasto campo de sombras, assolado pelo “neoliberalismo”, onde se arrastam, gemebundas e inanes, multidões em sofrimento, esquálidas e cobertas de moscas e crostas. Neste tormentoso mundo de horror e morte, a besta negra maldita é o sistema de saúde americano, dado como o pior do universo, e não faltam especialistas que tal juram pelo seu coiro, começando pelo senhor Michael Moore, e acabando nos alegres “jornalistas” que se citam uns aos outros, em círculo fechado, como fontes credíveis.

19 de Setembro - Quem é que António Costa quer enganar? Vem dizer que «não devemos misturar as ideias pessoais de Maria José Nogueira Pinto sobre essa matéria com um projecto relativamente ao qual ela esteve ligada e que poderá vir a estar ligada no futuro».
Perdão, mas as coisas não se podem separar só porque tal seria o desejo do presidente da câmara. Evidentemente que as ideias pessoais de MJNP são relevantes. Tanto o são que a própria MJNP entende que sejam uma prioridade no seu novo cargo: «Outra prioridade imediata, diz, “é travar o declínio (da Baixa-Chiado)”. A antiga vereadora dá como exemplo “travar a proliferação das lojas chinesas, porque se continuam naquele território, nunca mais vai ser possível deitar mão ao pequeno comércio”. Nogueira Pinto considera que o comércio “é central” para a Baixa, mas sem as lojas chinesas, que “estão a dar cabo do comércio da cidade”.».

Ora, temos então uma de duas situações: ou António Costa desconhecia as ideias de MJNP e então não se entenderá porque a convidou, pois apenas restaria a incompetência política ou favor pessoal. Ou sabendo o que ela pensava e com isso a convidando, apenas agora aparentemente se afastará dessas ideias, pela reacção que as mesmas provocaram. O que será um sério desvio à verticalidade política, com resultado agravado pela manutenção do convite.
20 de Setembro - O Centro Cultural de Belém anunciou hoje ter encontrado no seu acervo um quadro de Júlio Pomar, intitulado “Camões”, dado como desaparecido há quatro anos.

Num comunicado enviado às redacções, o gabinete de imprensa do CCB adianta que a pintura de 1989 foi encontrada durante “a reorganização dos espaços das reservas” do centro, tendo já sido comunicado o facto ao pintor e à Polícia Judiciária, que abrira um inquérito ao desaparecimento. O quadro, um acrílico sobre tela de grandes dimensões (1,95mx1,30m), foi dado como desaparecido em Setembro de 2003, quando a Presidência da República solicitou ao Ministério da Cultura a sua cedência, a fim de ser integrado numa exposição de Arte Portuguesa que iria realizar-se em Istambul, adianta a nota.Um inquérito interno ao caso, ordenado pelo Ministério da Cultura, terminou meses depois sem que a obra tivesse sido localizada, conseguindo-se apenas apurar que fora vista pela última vez em público em Junho de 1994, numa exposição em Paris, tendo sido entregue ao CCB três meses depois.

Nos dois anos seguintes, surge listada em documentos internos, mas após 1996 não há mais informações sobre a sua localização no acervo. Referindo-se às conclusões do inquérito, em Janeiro de 2004, o semanário “Expresso” noticiava que a então directora do centro de exposições, Margarida Veiga, sublinhava “não era possível assegurar a total inviolabilidade das reservas” do CCB. Apesar do desaparecimento, nem o CCB nem o Ministério da Cultura apresentaram queixa às autoridades, mas a Polícia Judiciária acabaria por incluir o quadro na lista de obras de arte furtadas de colecções públicas – uma informação que é ainda visível no seu site. O acrílico foi adquirido a Júlio Pomar, por dez mil contos (50 mil euros), quando Vasco Graça Moura dirigia a Comissão dos Descobrimentos, tendo ficado registado como propriedade do Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), ficando na posse do CCB.

22 de Setembro - O presidente dos Bombeiros Voluntários de Arcos de Valdevez apontou ontem o centro de saúde local e uma empresa privada de ambulâncias como "os maiores responsáveis" no caso que culminou com a morte de um doente.
Para o presidente dos Voluntários de Arcos de Valdevez, Luís Sá, a BT "apenas fez o seu papel", já que "viu uma ambulância do tipo A-1, que não pode fazer urgências, com as luzes de emergência ligadas e alegadamente a cometer algumas infracções ao Código da Estrada e mandou-a parar, para ver o que se estava a passar".
Se este homem não fosse presidente dos bombeiros e se os agentes em causa não fossem da Brigada de Trânsito da GNR, alguém, ao ler esta notícia, poderia ser levado a pensar que um homem morreu porque alguns guardas estavam a fazer um frete para garantir aos Bombeiros o monopólio de transporte de doentes. Mas logo percebemos que não.

O que está em causa é apenas a observância escrupulosa dos preceitos estabelecidos numa sociedade civilizada. Fez a BT muito bem em obrigar o transporte ilegal a uma paragem de meia hora. Se o doente tinha pressa, que esperasse.

E, como cidadão cumpridor, aqui aviso desde já que se um dia alguém tiver que chamar uma ambulância para mim, exijo uma ambulância que não seja do tipo A1. Até posso falecer à espera, mas numa A1 nunca. Se o senhor presidente dos bombeiros de Valdevez diz que não servem, eu acredito.

Nova Aliança, 4 / Outubro / 2007

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