5.1.08

A nova barragem

A putativa construção da nova barragem no Tejo, entre Constância e Almourol, merece aqui umas breves palavras. Breves porque a ser levada a cabo, ela merecerá rios e rios de tinta. Justificadamente.
Vejamos então como se passam as coisas. O município de Abrantes tem o coeficiente do IMI ( Imposto Municipal sobre Imóveis ) mais alto do país. Quer isto dizer que quando pagamos os nossos impostos que revertem para o município somos considerados cidadãos de primeira, os mais ricos do país, aqueles que podem pagar o que alguém impõe.
Ora, o que vemos à nossa volta? Como estará a ser administrado o nosso dinheiro?
Os serviços hospitalares na cidade estão como nós sabemos e a saga ainda não acabou. Levam-nos as valências, temos de suportar as despesas dos transportes para outros hospitais, as taxas moderadoras não param de subir, gastamos cada vez mais tempo em lista de espera.
A megalomania inicial propunha-se associar à imagem do Aquapólis a construção de um teleférico, certamente para os turistas virem verificar com os seus próprios olhos esse milagre económico. Depois a ideia abortou, certamente porque a cabine do dito teleférico poderia embater contra os edifícios de seis andares projectados fora do Plano Director Municipal para a Encosta Sul.
Surgiu então o açude, essa maravilha da tecnologia que faria sobressair o famoso mar de Abrantes. A cidade nunca mais seria a mesma: água pública amarela, espaços verdes abandonados, serviços de limpeza com lacunas mas sempre havia o mar. A compra de uma canoa seria tão vulgar como a compra de vestuário no Inverno. Contas furadas, parece que agora os canoístas preferem outros “mares”.
Anunciou-se também uma nova programação cultural para o Cine-Teatro São Pedro: como na batalha naval, água. O cinema está às moscas, as outras realizações são um fiasco, o público cansa-se de tentar conhecer os nomes anunciados nos cartazes. Chamariz e divulgação de projectos alternativos? Não brinquem. A Feira da Ladra está como todos nós sabemos mas não se esqueçam, temos um campo de basebol. Conseguimos assim ser visionários, talvez um dia, quem sabe, a modalidade seja mais popular.
Somos, por tudo isto, bons cidadãos, pagamos muitos impostos e por isso temos de merecer e agradecer o que fazem por nós. E a verdade é que eles se esforçam mesmo por nos dar novidades continuamente. E voltamos então ao açude.
A construção da barragem destruirá projectos inaugurados há menos de um ano e investimentos superiores a 20 milhões de contos. VINTE MILHÕES DE CONTOS. Estou curioso em saber a posição dos nossos presidentes das juntas de freguesia, sempre em dificuldades para melhorar a qualidade de vida nas nossas aldeias, perante este escândalo. Com a barragem, perderemos terrenos cultivados e casas de habitação, teremos ( eu, o leitor e os seus vizinhos somos ricos, não se esqueça ) de pagar as expropriações dos que ficarão sem casa e perderemos alguns equipamentos que já existiam antes.
Encarregue de transmitir as novidades, aparentemente antes do tempo, o que terá provocado algum “frisson” com o presidente, o vereador Pina da Costa evidencia que a dita construção significará uma efectiva “diminuição de custos para o município”. Parece que o açude tem elevados encargos de manutenção. Esta conclusão, logo após a inauguração da obra, é realmente formidável. Então não existiram estudos, senhor vereador? Então não fizeram contas, senhor vereador? Então avançaram de olhos fechados, senhor vereador? Ou partiram, senhor vereador, do pressuposto de que como somos um concelho rico e sem problemas, quem viesse atrás que fechasse a porta e apagasse a luz?
A autarquia propõe-se explicar aos munícipes as implicações que poderão surgir com a referida construção mas o vereador não deixa margens de manobra: “Tenho a certeza que eles irão entender o nosso ponto de vista”. Lamento desiludi-lo: não vou entendê-lo mas quero tirar-lhe um peso de cima. Peço-lhe que não pense por mim, não vale a pena até porque isso é feio.
“A construção do açude foi uma decisão oportuna num determinado tempo mas as coisas evoluem”. Tem toda a razão o vereador Pina da Costa. Com o dinheiro dos outros podemos fazer umas coisas engraçadas, podemo-nos cansar e comprar um brinquedo novo e assim sucessivamente até ao próximo capricho. O vereador Pina da Costa administrará da mesma maneira o seu dinheiro pessoal? Estou curioso.

Nova Aliança, 13 / Dezembro / 2007

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