15.9.08

Os "spin-doctors"

Os tempos andam difíceis para os “spin doctors”. Por esta expressão são conhecidos os conselheiros dos governantes, aqueles que pretendem estar um passo à frente do comum dos mortais. E andam difíceis porque a conjuntura teima em não dar tréguas, em desdizer aquilo que defendem. Querem alguns exemplos em quase quatro mil caracteres?
Depois de se considerar “o melhor primeiro-ministro” da história, Sócrates teve um baque ao conhecer os resultados do referendo irlandês. O seu empenho, a sua dedicação, o seu esforço, tudo por água abaixo. Tantos planos, tantos arranjos, e afinal a estratégia esboroou-se, qual castelo de cartas. Quanta injustiça, como diria o Calimero!! Quem, como ele, prometeu um referendo sobre o tema aos portugueses, assiste até ao momento à vitória do “Não” ao Tratado Europeu em todos os países que realmente deram voz às pessoas.
A prestação da selecção não deixou também muitas saudades em São Bento. Aquele que seria um período de esquecimento dos problemas reais foi, afinal, mais curto que o desejado. Aí estão de novo as listas de espera nos hospitais, a subida da inflação, o aumento dos impostos, as dificuldades de todos os dias. Scolari não terá em Sócrates um admirador porque “ajudou” o país a reencontrar o país em crise. Ora, foi Sócrates quem o segurou depois da agressão a um jogador sérvio, o que não é de estranhar porque, dizem-me agora, a empresa de comunicação que gere a imagem da selecção é dirigida pela mulher de Armando Vara, um amigo e, mais do que uma esperança, uma autêntica certeza do panorama bancário português.
Depois os exames. Eles servem para complicar? Estão enganados, isso era antes. Agora é muito simples: aumenta-se o tempo de duração e diminui-se o grau de dificuldade. Daí a “sugestão” para serem afastados os professores correctores que se afastem da média. As estatísticas são o mais importante e, por comparação, temos de fazer boa figura lá fora. Se sobre esta questão subsistir alguma dúvida, faça-se esta experiência: peça-se a um aluno universitário que faça os exames deste ano e ouçam-se as suas respostas sobre o grau de dificuldade. Elas serão evidentes. Ainda na Educação, há contudo uma medida a realçar: o Dia do Diploma será comemorado a 12 de Setembro. Se o leitor não alcança a importância desta medida, está a ser também “injusto”: nessa data os nossos jovens ficarão com a vida mais facilitada e com um diploma dos estudos concluídos no bolso. A 13 de Setembro a sua vida será, certamente, diferente e o mundo mudará.
Finalmente, a pose. A cor da gravata é estudada ao pormenor. Ela é da mesma cor da mesa do estúdio. Na última entrevista que passou na RTP ( é incrível verificar que em momentos de crise, há sempre uma entrevista estratégica… ), tudo está feito para prestar um serviço de propaganda ao primeiro-ministro. O ar nervosinho dos dois jornalistas ( parecem ir prestar provas a um patrão possível ), aquela solenidade tossida e composta do ambiente no estúdio, aquele belo cenário em fundo condizente com a gravidade da coisa. Antes, as imagens da chegada e depois da caminhada de Sócrates para o estúdio - vedeta ansiada que chega com aquela leve mostra de nervosismo que convém sempre às grandes personagens cientes da sua tremenda, pesada responsabilidade. Ele vela por nós. Não se preocupem, pequeninos desamparados e aflitos. Ei-lo que chega. E ele logo à primeira pergunta, a da "crise", põe aquele ar
( quem não vê que é postiço? ) de gravidade ( o peso, o tremendo peso... ), de franzida preocupação. A situação é muito difícil, é, não brinquemos à política que eu estou aqui para me preocupar com coisas sérias e para vos tratar da saúde. E trata mesmo, essa é que é a verdade!

Nova Aliança, 10 de Julho de 2008

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