25.10.09

Os políticos eo 'interesse geral'

Com o devido respeito, eis um texto do professor Paulo Guinote, publicado no blog ‘A Educação do meu Umbigo’ ( http://educar.wordpress.com ):
“Há em alguns políticos e comentadores a tentação para se erigirem como detentores da capacidade de enxergarem e defenderem o Interesse Geral contra os mesquinhos interesses corporativos.
Criticam quem defenda a verdade, o rigor com os factos e as promessas, mas depois são eles que têm uma verdade maior, a verdade do Interesse Geral. Os outros são defensores de interesses particulares, menores, egoístas.
Esta é uma atitude profundamente arrogante porque Interesse Geral eu não conheço, nem nunca conheci como se determina ou se coloca em prática, ou defende, porque não passa de uma abstracção retórica. Ou então o Interesse Geral mais não passa do que o agregado dos diversos interesses particulares dos cidadãos de uma dada sociedade.
Aliás, o Interesse Geral, colocado assim, acima dos interesses dos indivíduos, remete-nos para um caldinho cultural vizinho dos regimes autoritários e totalitários que erigiram a Raça, a Nação, a Religião ou a Classe como Interesses Gerais do seu projecto político, espezinhando pelo caminho os interesses particulares e os indivíduos que se opuseram a esse projecto Colectivo de Unidade.
E acho estranho que quem se assuma defensor da liberdade, ou liberal no sentido político ou económico, embarque nestas aventuras estranhas do Interesse Geral, indemonstrável e volúvel conforme os contextos.
Só para contextualizar, relembremos o caso do défice, que em 2003 qualificaram como obsessão, em 2005 já era de Interesse Geral e agora em 2009 tem dias: se é para uns efeitos pode agravar-se, se é para outros deve conter-se.
O Interesse Geral mais não passa do que de um manto usado para cobrir interesses de facção, elevando-os a um patamar superior.
Eu prefiro ser realista e explicar o meu interesse particular. E acho que é da soma dos interesses particulares, conjugando-os, mas sem sacrificar brutalmente nenhuns, que se atinge um projecto de sociedade verdadeiramente liberal no sentido mais radical do termo.
Quem está sempre a acusar os interesses corporativos, sabe bem que uma sociedade não se constrói sobre uma amálgama indiferenciada de indivíduos, sem identidades socioprofissionais, por exemplo. A menos que seja esse o projecto do Interesse Geral: tornar a sociedade uma mera amálgama de indivíduos indiferenciados.
Há que fazer opções, é certo. A manta não dá para cobrir todos, aceito. Mas preciso que me expliquem e fundamentem as opções tomadas, não apenas que as enunciem como inadiáveis e há muito necessárias. É preciso mais do que isto.
O Interesse Geral não pode ser um vazio usado para ocultar vazios de ideias e projectos ou para legitimar opções políticas e económicas resultantes de interesses particulares, esses sim, transitoriamente com as rédeas do poder político para os impor ao resto da sociedade.
Por isso, sempre tive dificuldade em rever-me em projectos políticos com soluções mágicas para tudo, evocando um qualquer tipo de Interesse Geral para colocar o Colectivo acima do Indivíduo. Sejam de esquerda, de direita ou do centro.
Sejam baseados em Magalhães, em Livros Verdes, Vermelhos ou Laranjas. Na Bíblia ou em bíblias.
A deriva totalitária, mesmo que em democracia formal, é uma tentação de todos os homens que se acham providenciais.
O Interesse Geral, nova formulação aparentemente mais vazia dos velhos projectos de subordinação das massas aos projectos políticos de facção, não me serve como argumento para nada.
Em especial quando surge enroupado em coisa nenhuma, tirando fatiotas elegantes e meneios estudados.”


Nova Aliança, 1 / Outubro / 2009

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