22.5.09

Vital no 1º de Maio, as crianças nos tempos de antena e as diferenças na Educação

1 de Maio – Vital Moreira acordou hoje bem disposto. Olhou para o calendário e sorriu. Há quanto tempo não participava na manifestação do 1º de Maio? 10, 15, 20 anos? Um impulso súbito empurrou-o para a rua. Sentiu um apelo do coração para estar presente. E como se apresentaria? Como representante do PS? Mas, que diabo, ele não é sequer filiado no PS. Em anteriores eleições europeias, sempre próximas do 1º de Maio, algum outro candidato do PS se foi mostrar ao vivo na manifestação da CGTP?

2 de Maio - O deputado socialista Ricardo Rodrigues, com cara de poucos amigos, acha que é normal os miúdos de Fafe serem grosseiramente interrogados por inspectores do Ministério da Educação; em sua opinião, novamente sem se rir, grave é a ministra ter sido impedida de visitar uma escola. .
Este senhor pertence à mesma geração que achava piada quando os políticos eram recebidos com assobios e ovos, ou quando os "adolescentes rebeldes", pobres coitados, mostravam o rabo a Manuela Ferreira Leite. Adoravam quando alguém pespegava uma tarte na cara de um político e orgulhavam-se de passar pela ponte 25 de Abril (durante o bloqueio) sem pagar. Sofriam da euforia dos revolucionários, que os levava a insultar ministros ou a gritar palavrões aos adversários. Agora, não. ( Passou quanto tempo? ) Agora, respeitinho. Dá pena, mas é assim…
4 de Maio - Diálogo previsível em breve:
- Se faz favor, para o Pingo Doce?
- A senhora vai sempre em frente. Quando chegar à rotunda vira à esquerda e depois é, passando o "porreiro pá", logo à direita.
- Ora bolas, tinham-me dito que era depois do Vital Moreira e já tive que dar uma volta enorme...
- Isso foi alguém que não é de cá e fez confusão, de certeza. O Minipreço é que é logo a seguir ao Vital Moreira. Mas é o Minipreço...



6 de Maio – As diferenças entre o antes e o depois 1974. Os professores:

- Tinham menos horas burocráticas na escola do que agora!
- Algumas reuniões eram pagas como trabalho extraordinário!
- Era bem mais fácil dar aulas, os alunos respeitavam os professores!
- O prestígio dos professores era incomparavelmente maior!
- Os alunos sabiam muito mais!
- Os alunos dos colégios, mesmo os da igreja, tinham de fazer exames no ensino público para passarem de ano (não havia a batota de agora: quem tem dinheiro vai para colégios e tem notas altas).
- Qualquer pessoa com valor tinha acesso a um ensino de elevada qualidade nos liceus ou nas escolas comerciais/industriais!"

7 de Maio - Uma escola do 1º Ciclo de Castelo de Vide foi contactada para uma reportagem sobre o computador "magalhães".
O contacto foi feito por alguém que se identificou como estando a falar em nome do Ministério da Educação.
Os professores pediram então autorização para recolha de imagens aos pais das crianças.
Na data marcada foi efectuada a reportagem em nome do Ministério da Educação.
Sucede que no dia 22 de Abril, a comunidade escolar de Castelo de Vide ficou chocada com o resultado da reportagem.
Os pais, alunos e professores verificaram, pela televisão, que não se tratou de uma recolha de imagens para o Ministério da Educação, mas antes para um tempo de antena do Partido Socialista.
Passados todos estes dias ainda não foram apuradas responsabilidades.

Nova Aliança, 16 de Maio de 2009

A privacidade, o vestuário da loja do cidadão e as prioridades

12 de Abril - Leio por aí alguns autores que defendem o direito à privacidade de jornalistas e políticos. Concordo, claro, assim essa privacidade seja preservada pelos jornalistas e políticos. Apresentada a questão desta maneira, julgo que poucos deixarão de concordar. Mas quando são os jornalistas e políticos a divulgarem repetidamente, de um modo ou de outro, dados objectivos que deveriam fazer parte da sua privacidade - um exemplo, fazendo com que uma ópera comece atrasada por causa deles próprios - não vejo onde está a violação de qualquer direito que seja. Mais: qualquer jornalista tem o direito a não ser chamada de namorada de um político qualquer, mas qualquer leitor tem também o direito a desconfiar das opiniões de uma jornalista que escreve repetidamente sobre assuntos relacionados com o seu namorado.

14 de Abril – Lembram-se d’ “O Zé Faz Falta”? Pois bem, o sr. Sá Fernandes – esse triste vereador da Câmara Municipal de Lisboa, depois de ter ornamentado o Marquês de Pombal com os seus cartazes, não queria agora que os outros pusessem lá os cartazes deles. Digamos que é uma visão muito “peculiar” da democracia. Os partidos em causa ignoraram o Zé e a Comissão Nacional de Eleições até lhes deu razão. O Zé, desde que está enfiado no bolso de trás das calças do dr. António Costa, não acerta uma.

15 de Abril – Na Loja do Cidadão de Faro, que o eng. Sócrates considerou "a mais avançada do país", as funcionárias foram proibidas de envergar: saias curtas, decotes, saltos altos, roupa interior escura, gangas e perfumes agressivos.
É questão de gosto e explico porquê. Por mim, dispenso as gangas. Os perfumes, especialmente se "agressivos", também. Mas julgo que o resto da indumentária interdita faria maravilhas pelo relacionamento entre a administração pública e os cidadãos, sobretudo quando as respectivas lojas não cumprem a rapidez que a propaganda anuncia e obrigam os desgraçados a passar horas em pé para requisitar um papel que lhes será entregue meses depois. Embora dependendo de quem estivesse dentro deles, os decotes e as saias reduzidas sempre seriam uma compensação para a parcela masculina do povo em fila. E, quem sabe, talvez os devedores ao fisco aparecessem…
Segundo consta, tal decisão coube à dona Maria Pulquéria ( curioso nome!! ) Lúcio, curiosamente vogal da Agência para a Modernização Administrativa (AMA), uma das dezoito mil instituições estatais que servem a população e, principalmente, a parte da população nelas empregada.
Por curiosidade, consultei o currículo da dona Pulquéria e verifiquei que, antes da tal AMA, a senhora passou pelo PRACE, pelo CRIP, pelo SIAFE, pelo IIAE e pelo BDAP. Não serviu de muito. Sob o entulho "progressista" dos acrónimos, sobreviveu a Pulquéria proverbial, cujo nome é todo um programa e, de brinde, uma metáfora do país oficial e uma lição. Pode-se cobrir Portugal de siglas, Simplex, banda larga, Magalhães, SMS, cruzamento de dados, cartões quinze em um, chips nos cartões, nas matrículas e nas cabeças: mal se remove o verniz "funcional" do "futuro", o mofo do passado, seminarista e mandão, mostra a sua cara. Quem nos quer mudar não muda e, desculpem a rima, a dona Pulquéria não ajuda. Neste país, há sempre algo que não condiz com o resto.

18 de Abril – As prioridades da nossa comunicação social são intrigantes.Um terramoto mata perto de 300 pessoas em Itália e a primeira, e típica, preocupação dos nossos "media" é averiguar se não há portugueses entre as vítimas. A segunda preocupação é entregarem-se ao escândalo por Berlusconi ter pedido aos desalojados que se imaginassem no campismo.
Certamente que é escusado insistir na infelicidade da frase, cujo autor é useiro e vezeiro em trapalhadas semelhantes. Fiquemos pelas calamidades "naturais". Ora, por cá, a revelação de que a gripe do início do ano matou cerca de 1500 criaturas (segundo o Instituto Ricardo Jorge) suscitou ao secretário de Estado da Saúde o seguinte comentário: "a resposta à epidemia foi razoável". Não sei se uma resposta "fraquinha" se teria traduzido em cinco mil mortos, uma resposta "má" em dez mil, e uma resposta péssima na repetição da "espanhola" de 1918. Não sendo sismógrafo ou especialista em saúde pública, também não sei até que ponto as consequências de uma gripe são mais ou menos evitáveis que as consequências dos tremores de terra.
O problema reside no facto de que a mesma imprensa aflitíssima com Berlusconi ignorou generosamente o lapso do secretário de Estado, embora este exprima a indiferença da tutela perante um sistema de Saúde que trata os pobres como bichos e, implicitamente, sugere aos restantes que se curem no "privado" ou na civilização. Além disso, parece-me que 300 ( ainda ) é um número menor que 1500; ainda por cima 1500 portugueses, cuja morte, pelos vistos, só conta se acontecer no estrangeiro.

Nova Aliança, 2 de Maio de 2009