7.1.11

A crise, as praxes e uma lição de vida

22 de Novembro – As notícias são hoje, infelizmente, quase diárias ("Cinco mil famílias em lista de espera para receber apoio alimentar de instituições"; "Classe média está a chegar à sopa dos pobres"...) e, nelas, alguns poucos parágrafos davam conta ontem do apelo do arcebispo de Braga aos párocos para que dêem um "sinal sacerdotal" e prescindam do salário de um mês para acudir "àqueles que, cada vez mais, não têm o mínimo para sobreviver". "Trata-se - diz o arcebispo - de colocar em questão este modelo económico e acreditar que a solidariedade tem capacidade para dar dignidade a todos".
A obra assistencial da Igreja, juntamente com a de instituições como o Banco Alimentar ou as Misericórdias, é hoje a última fronteira da esperança de muitas dezenas de milhares de famílias que a "crise" (é difícil escrever a palavra sem aspas quando a Banca, poupada aos "sacrifícios para todos", continua a lucrar milhões por dia) atirou para a fome e a miséria. E todos os dias se ouvem apelos da parte do clero à solidariedade. Mas é a primeira vez que um bispo vem louvavelmente lembrar que, "na partilha, os sacerdotes não podem pôr-se de lado".
Neste contexto, seria bom a própria Igreja não se pôr de lado e decidir-se a prescindir de uma pequeníssima parte dos rendimentos do Santuário de Fátima a favor "daqueles que, cada vez mais, não têm o mínimo para sobreviver".
26 de Novembro – No Outono, com o cair da folha e o início do ano lectivo, começam a ver-se por aí, onde existam universidades e aparentados, os habituais espectáculos de bandos de imberbes caloiros apascentados por não menos imberbes "doutores" ministrando-lhes todo o tipo de boçalidades e indignidades que a rasca imaginação lhes permite, com o devido enquadramento de bebedeiras, comas alcoólicos e música pimba que ilustram o nível moral e intelectual não só dos futuros caixas de supermercado da Nação mas igualmente das escolas que os formam.
Todos os anos a história se repete mas pelos vistos ninguém aprende. Pôr jovens estudantes de joelhos e obrigá-los a suportar com um sorriso nos lábios as prepotências dos mais velhos é, alega-se, uma forma de "integrar" os alunos recém-chegados na vida e no espírito universitários. E, Deus nos valha, se calhar é. Não restem dúvidas de que, de tal ponto de vista, as universidades cumprem até à excelência a missão que, de há uns tempos para cá, alegremente pretendem assumir, não de lugares de estudo e investigação, mas de fornecedores de mão-de-obra qualificada (na circunstância em despotismo e docilidade acrítica) ao mundo empresarial e do trabalho.
2 de Dezembro – Por falar na universidade, no ensino e no mercado de trabalho, esta é uma história que todos os pais deveriam ler à noite aos filhos para que eles possam aprender que, ao contrário do que professores antiquados ainda ensinam na escola, não é com estudo e trabalho, ou com mérito, que se vai longe na vida.
Pedro era um petiz de palmo e meio e frequentava o ensino secundário. Vivia com o pai, funcionário do PS, numa casa da Câmara de Lisboa pagando 48 euros de renda. Cedo percebeu que, se tirasse um curso superior, decerto acabaria como caixa de supermercado e, miúdo esperto, rapidamente deixou as aulas e se tornou, como o pai, funcionário partidário. Obviamente estava lançado na vida. Algum tempo depois, rescindiu o contrato e, assim desempregado "por motivo de reestruturação, viabilização ou recuperação da empresa [o PS], quer por a empresa se encontrar em situação económica difícil", obteve do IEFP 40 mil euros de subsídios para a criação da sua própria empresa - que nem precisou de ter actividade - e do seu próprio posto de trabalho. Meteu os subsídios ao bolso e arranjou "o seu próprio posto de trabalho" na Câmara de Lisboa a ganhar 3950 euros por mês como assessor político (o que quer que isso seja) de uma vereadora do PS.
O "Público", que traz a história do jovem Pedro, hoje com 26 anos e um grande futuro político pela frente, sugere que ela é ilegal e imoral. Deixará de ser quando quem faz as leis fizer também a moral. Não tardará muito.

Nova Aliança, 9 / 12 / 2010

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