16.11.11

O aeroportdo de Frankfurt em Beja e Edite Estrela

15 de outubro – Querem perceber como chegámos aqui? Com exemplos destes: no primeiro semestre de 2011, o aeroporto de Frankfurt cresceu 8,3% em número de passageiros, para um total de 26,5 milhões. Numa escala diferente, o Aeroporto Francisco Sá Carneiro cresceu 17% em 2010, para um total de cinco milhões de passageiros. Numa terceira escala, o Aeroporto de Beja cresceu de forma incomensurável, e não precisou de dois semestres. Nem sequer de um. Para dizer a verdade também não precisou de muitos passageiros: em escassos quatro meses, subiu dos zero aos 798 felizes viajantes, os quais se distribuíram por 44 voos a uma média de 18,1 ocupantes por voo. A continuar assim, Beja terminará o primeiro ano de actividade com uns fulgurantes 2394 passageiros, só um nadinha aquém do milhão previsto para 2015 pelo saudoso Governo de Sócrates.”
Rui Oliveira, relações públicas da ANA, explica o sucesso: o Alentejo "é um destino de baixa notoriedade turística internacional"; a região "tem uma oferta hoteleira de reduzida dimensão e diversidade"; não há praias e é grande a distância até à Costa Vicentina, o que significa que "os transferes são onerosos"; "não existe uma cidade costeira alentejana onde o programa turístico se possa concentrar"; a região do Alentejo é "bastante quente" no Verão; os operadores turísticos e as companhias aéreas "evidenciam uma reconhecida aversão ao risco"; "não foi tarefa fácil" convencer o único operador turístico (inglês) a funcionar em Beja; foi "bastante complicado" convencer outros a comprar lugares nos charters em questão.
Critérios semelhantes ou aparentados justificariam a criação de aeroportos internacionais em Almeida, Nisa e Torre de Moncorvo. O que igualmente se justifica é uma pergunta: se, segundo a própria ANA, tudo conspira para tornar o Aeroporto de Beja um hilariante fiasco, que desmioladas, corruptas ou perversas cabeças se lembraram de o construir? Outra pergunta: porque é que as cabeças em causa não estão em tribunal, a responder pelos 33 milhões de euros gastos naquela simpática fraude? Os leitores conhecem as respostas e a sua justificação: isto não é um país a sério, é só um local mal frequentado.
Claro que ambas, respostas e justificação, esclarecem a presente situação de um país acabado, um país cujos descontentes protestam no centro de Lisboa em vez de se manifestarem por exemplo na pista de Beja (o volume de tráfego não ofereceria perigo), um país que parcialmente reclama a perpetuação dos exactos delírios que estrafegaram as suas contas. Por falar em contas, um cínico apuraria que o "investimento" no referido aeroporto chegava para financiar os táxis a partir da Portela aos dois mil e tal turistas anuais durante quatro ou cinco décadas - ou durante século e meio, se os turistas preferissem o rent-a-car. Já um optimista ouviria apenas o senhor da ANA garantir que, de acordo com um inquérito realizado às dúzias de pioneiros britânicos que aterraram no terminal do Baixo Alentejo, a "qualidade percepcionada foi alta". Valha-nos isso, estamos muito mais descansados agora.
17 de outubro – Confesso que gosto da senhora. Diz umas graças e alegra-nos nestes dias mórbidos. Além disso, acho profunadamente injusto admirar as proezas dos escassos compatriotas célebres no estrangeiro e ignorar Edite Estrela. O que fez ela desta vez? Apresentou no Parlamento Europeu uma declaração a exigir junto da ONU que o dia 22 de Setembro seja consagrado como o Dia Internacional da Rapariga. O objectivo, cito, é "assegurar que as raparigas usufruam do investimento e reconhecimento que merecem como cidadãs e importantes agentes da mudança". A proposta não surge agora por acidente: surge em plena Semana Europeia da Acção pelas Raparigas, invenção que coube, é escusado acrescentar, igualmente à dra. Edite.
Claro que, dado o significado da palavra no Brasil, é duvidoso que a dra. Edite conte com o entusiasmo da "presidenta" Dilma. Mas nada de dramas: não faltarão apoios às pobres raparigas que, volto a citar, "têm maior probabilidade de sofrer de má nutrição, estão mais expostas à violência ou intimidação, bem como a serem traficadas, vendidas ou exploradas sexualmente". Uma investigação recente sugere também que as raparigas são mais sujeitas a preencher o expediente laboral com disparates. Mas esta conclusão é resultado de uma amostra restrita que apenas incluía a dra. Edite. E a quem, por cortesia, os investigadores não perguntaram a idade.

Nova Aliança, 27 / Outubro / 2011

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